terça-feira, 28 de dezembro de 2010

Opostos

Tantos apelos à Paz e à Concórdia que se fazem pelo Natal, não podem deixar esquecer porque é que eles se fazem. Fazem-se porque vivemos rodeados de inúmeras guerras. Poucas guerras grandes e muitas pequenas.
A guerra é certamente a experiência-limite mais radical que a humanidade pode passar. Andar a fugir com medo de ser morto ou torturado; perseguir os outros para os matar ou torturar, para lhes matar os filhos, destruir as suas casas, queimar-lhes o sustento, envenenar-lhes a água... Não há certamente nada de tão limite como este terror e procura da morte. Matar ou ser morto. O ódio absoluto.
E por trás de cada um destes terríveis actores há ternura, há afagos, lágrimas, há saudades. Lá longe...
A guerra é também matar quem ama o assassinado: os pais, a mulher, a namorada, os filhos, os amigos, as suas ideias, o seu país...


Vejo atrás dos monstros
mãos que se dão, almoços de domingo
crianças que correm
e têm as suas cabeças afagadas.
Atrás deles vêm todas estas lágrimas
Todos os gritos impotentes
Todo o mal irremediável.
E meto a bala na câmara:
quantas lágrimas vai ela custar?
Disparo de olhos abertos
para não ver. Não posso ver!
Disparo de longe
para só ver os vultos simiescos.
Quero lá saber!
Quero lá saber!
Se matar talvez chegue a casa
para almoçar no domingo.

segunda-feira, 27 de dezembro de 2010

40

São 40 (quarenta) os livros que se publicam POR DIA em Portugal.Nem todos de ficção certamente. De poesia quantos serão? Se forem 5% são 2 por dia o que prefaz 730 por ano. Serão tantos? Se for só um por dia? Faz 365 por ano. E se houver destes 365 10% que valha a pena ler? São 36.
E eu quantos livros de poesia portuguesa li no ano passado? Talvez 16. (E o resto... sem ser em Portugal?
Raio de vida curta!

domingo, 26 de dezembro de 2010

Mais dois de Inverno

o vento e o Sol
vêm da terra -
encaram a onda.


madrugada na praia -
aquele quebrar da onda
só eu vi.

E ainda...

um velho
caminha no cais -
rangem os barcos atracados.


que pesada a gaivota
quando se eleva da areia -
mas depois...

sábado, 25 de dezembro de 2010

E mais dois ainda...

risco preto
mancha branca -
pontapé no muro.


vento de terra:
a onda anuncia-se
por um véu de espuma.

sexta-feira, 24 de dezembro de 2010

E mais dois de Inverno

véspera de Natal
de madrugada, ainda acesos
o farol e a Lua.


a primeira marca
da pata da gaivota
na pele da areia.

quinta-feira, 23 de dezembro de 2010

Três haiku de Inverno

manhã de Dezembro
na praia as ondas
correm para o Sol


dabaixo da estátua
um jardineiro varre folhas
à chuva miúda.


o vento e os meus olhos
chegam ao quintal vazio
pela frincha da porta.

quarta-feira, 22 de dezembro de 2010

Ser natural

A poesia haiku está ligada à Natureza. E o que significa "estar ligado à natureza?". Por um lado significa que Natureza (o mundo natural) deve estar presente na poesia: as montanhas, o sol, a lua, os lagos, o mar, a terra, os pássaros, a água, o fogo, etc. etc.
Mas significa também que a poesia deve ser natural no sentido de não ser pretenciosa, afectada, diletante, artificial. Uma poesia desta só pode ser escrita se o poeta for "natural". E regressa a questão: "Que é ser natural?".
Ser natural é não se motivar pala opinião que os os outros têm de nós. É certamente aprender com a vida e com os outros mas não deixar que as opiniões, os planos ou as expectativas que os outros têm sobre nós nos determinem a vida. "Sermos nós próprios". Aprendendo tudo mas na hora de decidir agir só de acordo com o que achamos que está certo. Isto é agir de forma "natural".

lindo o caracol!
e não se viu
ao espelho.

domingo, 19 de dezembro de 2010

Pressão

Como ela tem aumentado! A pressão arterial, a depressão...Que me perdoem os estudiosos da depressão mas eu diria que a depressão está intimamente ligada à alienação. Já Karl Marx dizia que a alienação é um processo que separa o trabalhador do seu trabalho, isto é, da fruição, do prazer de fazer o seu trabalho.
A pressão que actualmente, em nome da "crise", se abate sobre os trabalhadores tem muito a ver com o facto dos ritmos, dos procedimentos não permitirem que cada pessoas controle o trabalho que faz, se satisfaça em o ver feito e possa usar o trabalho para aquilo que ele devia ser: uma actividade humana e como tal completa e realizadora.
Separar as pessoas da fruição do seu trabalho, comprometê-las em trabalhos dos quais não se tem controlo, desumaniza o trabalhador e deprime-o.

o roupeiro da equipa
nunca pode ver o jogo
de futebol.

5 máximas

1. Dança como se ninguém te visse
2. Dá como se ninguém soubesse
3. Tem compaixão como se não tivesses mais nada que fazer
4. Fala como se o que dizes fosse útil
5. Ama como se não soubesses que vai acabar.

sábado, 18 de dezembro de 2010

Bambu

O escritor António Lobo Antunes publicou há alguns anos um livro (que eu não li...) com um título sugestivo: "Que farei quando tudo arde?". A pergunta á muito pertinente agora que parece que os valores, os hábitos, as práticas, as rotinas, etc. se estão a alterar tão rápida e radicalmente que podemos pensar que "tudo arde". O que arde e se vai esfumando são os processos e os pressupostos com que se fazia quase tudo desde a economia, à educação, passando pelas relações humanas. Lembrei-me de responder à pergunta do António Lobo Antunes. Que fazer?
Encharca-te, pá! Não te incendeies só porque tudo arde. Mantem-te molhado. Não digas que agora não vale a pena. Sempre vale a pena a tua actuação e pensamento. Mesmo que não seja para prevalecer serve para contrabalançar o incêndio. Vai dizendo e fazendo e analisando com a tua consciência o que és e o que fazes. E deixa para lá os pirómanos...

um pardal:
no mais firme nos bambus
batidos pelo vento.

quinta-feira, 16 de dezembro de 2010

Pensar à volta do "click"

A publicidade aos computadores assenta em dois pilares: a memória e a rapidez. Claro que uma está ligada à outra: quando a memória está muito carregada a informação anda mais devagar... Mas hoje queria falar da rapidez.
Já trabalhei nesses computadores super rápidos: ao menor "click" aparece outra janela e os diferentes ambientes sucedem-se vertiginosamente. Isto é que parece ser o bom, não é?
Eu faço a apologia dos computadores lentos; aqueles que depois de clicar ficam uns exasperantes dez segundos até mudarem para o programa ou que pedimos. E porquê? Porque é que na idade da rapidez eu louvo os computadores lentos?
É para ver se temos tempo de pensar... Já avaliaram quantos "clicks" frenéticos e inúteis (raivosos ?)damos ao nosso computador? Com um computador mais lento talvez tenhamos uma oportunidade de pensar "à volta do "click": "Era mesmo isso que eu queria?", "O que é que vou escrever?", "Vale a pena?" "Será este o "tom"?
Vivam os computadores lentos! Os únicos próximos do nosso ritmo! (Mesmo assim ainda talvez mais rápidos que nós...)


Dança:
o pensamento flui
ao ritmo do corpo.

terça-feira, 14 de dezembro de 2010

Bolsos

Há pouco tempo fui a uma conferência na Gulbenkian sobre arte japonesa em que se falou sobre o "inro" japonês - aquela pequena bolsa suspensa ao pescoço. Visitei depois a (fantástica) exposição de pintura no Museu Nacional de Arte Antiga sobre os "primitivos Portugueses".
E que tem uma coisa a ver com a outra?
É que reparei que nos numerosos quadros pintados entre 1450 e 1550 não havia bolsos no vestuário nem pinduricalhos atados à roupa. E pensei...
Durante muitos séculos não precisamos de trazer nada connosco, depois vieram os bolsos (sempre cheios de "coisas"), depois as pastas (cheias de papéis que muitas vezes passeamos sem precisar) e agora trazemos o "portátil" com as nossa músicas, as nossas fotos, a nossa enciclopédia virtual, os nossos ficheiros, etc. etc. etc.
Cada vez precisamos de transportar mais coisas connosco. Porquê?
Talvez: 1. porque o que nós somos depende cada vez mais do que temos e 2. porque passamos para os bolsos e para "o portátil" o que devia estar na nossa mente e no nosso coração. Talvez...

A idade da água.

barulho de água
sentado no banco um velho -
um novo e uma velha.

domingo, 12 de dezembro de 2010

O triste de aprender

Quanta conotação de tristeza e de punição está ligada ao sublime acto de aprender! Pune-se o outro "para que ele aprenda": a omissão, o castigo verbal, o cinismo, a humilhação são quantas vezes justificadas pela "aprendizagem"? ´"É para aprender!"
Aprende-se com a dor? Tenho dúvida.
Com a dor sofre-se, com a dor evita-se, não se faz, não se volta a fazer. Mas fazem-se coisas novas? Não.
Aprender é ligar o que somos com coisas novas e que não suspeitavamos que eramos capazes. Aprender é ser, fazer, poder coisas novas.
E isso consegue-se com castigos? De certo não.


um caracol
no passeio depois da chuva -
abriga-te na relva!

O Ruy e eu.

Quantos cabelos é preciso perder
para ser careca?
Quantos centímetros é preciso ter
Para ser "alto"?
Quanto tempo tem de passar
para ser demais?
Quanto amor deve de ser negado
para ser pouco?
Quando é que já chega?
Quando sobra?
Quando falta?
Quantos amores têm de morrer
Para abalar tanto as raízes da nossa vida
Que se nos torna natural partir?

sexta-feira, 10 de dezembro de 2010

Soltei o corpo:
a água do rio
balançou-o para o mar,
para o largo mar.

Não levei saudades
da terra:
nem o frio da água
me fez pensar
em voltar

Só foi comigo
uma tristeza fina como seda
macia, fria e quase afago.

Gaivotas de vidro azul
volteiam no céu leitoso
e os reflexos já laranja
nas suas asas
anunciam a noite.

quarta-feira, 8 de dezembro de 2010

Investimentos desiludidos

Breve lição de Economia

1 Se em Janeiro de 2007 tivesse investido 1.000 euros em acções do Royal bank of Scotland,um dos maiores bancos do Reino Unido ,hoje teria 29 euros
2 Se em Janeiro de 2007 tivesse investido 1.000 euros em acções do Fortis,outro gigante do sector bancário hoje teria 39 euros
3 Se em Janeiro de 2007 tivesse investido 1.000 euros em vinho Tinto do Douro e o tivesse bebido todo e vendesse apenas as garrafas hoje teria 46 euros

Conclusão - No cenário economico actual perdes menos dinheiro sentado bebendo um bom vinho

segunda-feira, 6 de dezembro de 2010

Yingato e Yangato

Concurso Internacional de Haiku / International Haiku Contest

Em Janeiro a Associação de Amizade Portugal-Japão vai organizar um Concurso Internacional de Haiku. O concurso estará aberto até 31 de Março e aceitará poesia em português e em inglês. O regulamento já está pronto e muito em breve estará a correr nas páginas da internet.
O tema do concurso é o Mar e a Viagem.
Podem começar a preparar os haiku...


January 2011, the Friendship Association Portugal-Japan will organise an International Haiku Contest. This contest will accept applications till the 31rd of March in Portuguese and in English. The Rules of the Competition will be soon on Internet.
The main theme is the Sea and the Voyage.
You may start preparing your haiku...

sábado, 4 de dezembro de 2010

Workshop de Haiku

O animador de uma workshop de Haiku raspou duas pinhas uma na outra.
- O que lhes lembra este som?
Várias respostas: "uma peça a encaixar", "um ácido", "um abandono"...
Até que um dos participantes disse:
-A mim lembra-me sexo!
- É a resposta mais original que eu ouvi até hoje! Pode explicar porquê? - perguntou o animador.
- É que eu não penso noutra coisa...

domingo, 28 de novembro de 2010

British Museum


Só anteontem comprei o livro "The British Museum Haiku" de 2002 (The British Museum Press). Vi-o quase por acidente na livraria de um museu de Lisboa. É um livro lindíssimo: a ideia é juntar xilogravuras japonesas da colecção do Museu Britânico com poesias haiku dos mais famosos poetas japoneses: Issa, Bashô, Buson, etc.
Quem organiza este livro - e que cuidadosa é a edição... - é David Cobb poeta, grande divulgador e estudioso de haiku e Presidente da British Haiku Society.
Fica aqui a capa do livro feita a partir de uma xilogravura de Eishosai Choki (c.1795). Linda, não é?

quarta-feira, 24 de novembro de 2010

A Fé

E ainda falam da crise dos valores imateriais na nossa sociedade... Em plena crise, quando parece que tudo se resume a balanças de pagamento, taxas de juro, individamento externo, mercados bolsistas, etc. etc. acho que nunca a Fé e a Confiança estiveram tão presentes.
Afinal o que faz subir e baixar a Bolsa? É a Confiança. Confiança em quê ou em quem? Não se sabe... é a Confiança... guiada por ténues e desconhecidos indícios. Querem maior metafísica que esta?
E a Fé? Quando as pessoas mais capazes do país nos juram opiniões opostas sobre assuntos tão objectivos como dinheiro, execução fiscal ou orcamentária, que nos resta a nós? É mesmo a Fé. A Fé neles, a Fé no partido, a Fé que, por muito mau que esteja, "isto" vai melhorar. Mesmo quem acha que vai piorar tem Fé que não piore muito...
A Confiança e a Fé. Antes com as Igrejas, hoje com os mercados. Nunca houve tanta.

Haiku Diário

Quando se escreve poesia? Ora aqui está uma pergunta que teria as mais singulares (e por isso inusitadas) respostas. Há mesmo quem esteja em estado permanente e diário de produção poética. Recomendo a este propósito o excelente blog:
www.joo-dailyhaiku.blogspot.com

no céu de Inverno
um buraco azul:
um balão de criança!

terça-feira, 23 de novembro de 2010

Dentes...

chega a noite
lá longe as badaladas -
Lateja o siso.

segunda-feira, 22 de novembro de 2010

Dentro do vento

vozes silenciosas
dentro do vento de Inverno -
de longe pra longe.


silent voices
inside the Winter's wind -
from far away to far away.

sábado, 20 de novembro de 2010

Defesa

Não existem no mundo Ministérios de Ataque. São todos da Defesa. Em Lisboa, hoje, os homens e mulheres mais poderosos do mundo discutem... a defesa. Defender-se de quem?. Uns dos outros? Não! Defrender-se dos "outros". Mas... que outros? Todos os que têm realmente poder para ferir gravemente os "outros" estão sentados à mesma mesa para discutir como se hão-de defender dos "outros". Os outros são os fundamentalistas, os terroristas, as milicias do Hamas, do Afeganistão, da Chechénia,... enfim a tropa fandanga. Mas o que se discute é como usar os escudos antimísseis, é o armamento nuclear.
Mas, afinal, quem são os outros?


disse o caracol:
- A minha concha é o meu ataque
contra a morte!

sexta-feira, 19 de novembro de 2010

O velho leão / The old lion

na parede
o leão desdentado
tem uma foto dos dentes.


on the wall
the teethless lion
hangs a photo of his teeth.

terça-feira, 16 de novembro de 2010

O haiku de hoje...

és a porta
entre o meu quarto escuro
e a sala com sol.


you are the door
between my dark bedroom
and the sunny room.

quinta-feira, 11 de novembro de 2010

Amanhã


Entre as palavras que têm mais carga de esperança, conta-se a palavra "amanhã". Amanhã vai sair o livro "De Frente para o Mar", o tal "desejado" que em lugar de uma manhã de nevoeiro, escolheu a companhia do S. Martinho, do "Indian Summer" para espreitar o mundo.
Aqui fica a capa.

quarta-feira, 10 de novembro de 2010

Aprender

Aprender é compreender
Aprender é prender
Aprender dos outros e com os outros
Isto é: Compreender
ou comprender.
Aprender é comaprender.

sexta-feira, 5 de novembro de 2010

Besouro

besouro morto -
o pessegueiro seco
vê-se melhor.

quarta-feira, 3 de novembro de 2010

Planície

vazia.
mesmo assim a planície
parece calma.



empty.
even though the plane
looks peaceful.

terça-feira, 2 de novembro de 2010

Caro

comprava coisas caras
esperando um dia valer
tanto como elas.



buying expensive stuff
hoping someday
be as valued as they are.

sábado, 30 de outubro de 2010

Ainda o Tsukimi...

No dia 23 de Setembro a Associação de Amizade Portugal-Japão organizou um Tsukimi . contemplação da Lua de Outono. A seguir ao jantar no Hotel Altis, os participantes escreveram alguns haiku que foram lidos e comentados em grupo.
Aqui ficam alguns deles:

Lua de Outono:
todas as núvens
se afastam.


Lua aveludada
acaricia
o silêncio da noite.


o vento
a soprar
nas minhas lágrimas.


estrela
a lua está ao pé de ti
não te preocupes.


Um espírito:
a Lua por trás
da chuva


É fácil de ver que foi uma noite linda!

terça-feira, 26 de outubro de 2010

Criatividade brasileira

Agora é sobre nomes de casas comerciais:

Lavandaria Moderna:
25 anos bem passados

Distriboi
Comércio de Carne

Casa a Caso
Imobiliário.

shopping

janela no shopping:
um jacarandá!
Enfim algo diferente.

sábado, 23 de outubro de 2010

Octobre - Paris

a caminho de Orly
a Lua cheia de um lado
e o Sol do outro.


cresce a Lua
declina o sol -
A noite vai ser linda?


A Lua e o Sol
a caminho de Orly -
O Sol e a Lua.

sábado, 16 de outubro de 2010

De Frente para o Mar

Parece que é desta!!! Parece incrível mas este livro, tão sonhado por mim, sofreu tantos reveses para a sua edição que várias vezes pensei em desistir. Só mesmo uma vara de determinação que às vezes encontro dentro de mim me fez insistir que este livro tinha de ser editado por vezes contra toda a racionalidade. Quando se olha os factos de forma "objectiva" não parece muito difícil: há empresas a patrocinar, poetas a escrever e uma editora a editar. Parece fácil, não é? Mas não foi. Não foi mesmo e este livro custou muito mais esforço do que era preciso.
Mas as boas notícias é que em meados de Novembro estará "cá fora". Ver para crer ou melhor ver para ler. "De frente para o Mar" a primeira antologia de poesia haiku de poetas portugueses. Parece impossível!!!

quarta-feira, 13 de outubro de 2010

Amanhã

Amanhã é outro dia
virá branco como este chegou
e, de certo, não sei
onde vou ver o entardecer.

porque amanhã é outro dia
e a luz da alba
iluminará jornais que escrevem
o que nunca foi escrito.

enquanto amanhã for outro dia
há sempre a esperança de um afago
de um cimento que cole a jarra
partida e dispersa pela mesa e pelo chão

é certo que é outro dia, amanhã.
E que é possível que o musgo
suba à altura dos castanheiros,
que a curva da face fique seca
e só os olhos brilhem ao sol.

Vento

nas árvores
já não se vê o vento -
o sol longo da tarde.

sexta-feira, 8 de outubro de 2010

A Crise

Hoje ouvi a explicação mais simples e mais certeira sobre a crise dada pelo economista Carlos Carvalhas antigo secretário-geral do PCP.
Diz ele que a crise foi originada no sistema financeiro que para a ultrapassar contou com chorudos milhões dados pelo Estado. Agora é o sistema financeiro que põe o Estado de joelhos ao comprar o dinheiro no Banco Central Europeu a 1% e a vende-lo ao Estado (juros da dívida) a mais de 6 %. Disse também que a especulação já escolheu a sua vítima (Portugal) e não vai larga-la facilmente.
O capitalismo é como um grupo de caçadores a seleccionar quem na manada parece mais frágil...depois é uma questão de tempo...


o leão
tirou a comida ao filho -
cresce e aparece!

quinta-feira, 7 de outubro de 2010

Executivos eficintes

Andam por aí: a sanear e "encolher" empresas, enfim a ver e a discernir o que mais ninguém era capaz de ver e de fazer. São os "yuppies" os executivos que "dão um jeito" no que está encalhado. Para eles não há passado, o presente é só uma etapa a ultrapassar para chegar ao futuro.
As linhas seguintes são para eles:

olhar o presente
e só o presente
sem saber de onde vem
e para onde quer ir
é a base para julgar
injustamente.

Tudo é mais que o seu presente
mesmo que este presente
seja triste, arruinado
e pareça sem futuro.

sem memória
tudo parece mais simples
mas também
irremediavelmente inútil
como uma jarra de flores
num quartel.

segunda-feira, 4 de outubro de 2010

Ferreira Gullar

Ferreira Gullar é Prémio Camões 2010. Este notável poeta brasileiro deu uma entrevista ao Jornal de Letras (22 Setembro) em que fala do seu processo criativo. Acho que o que ele diz tem muito a ver com a escrita de poesia haiku, sobretudo aquele "insight", o discernimento que se tem num dado momento. No Brasil dir-se-ia uma "sacada"...
Como Gullar diz que é assim que escreve poesia:

"Dá notícia do que acontece: um osso que bateu noutro ou, de repente, o cheiro a tangerina. O meu filho abre uma tangerina na sala, evidentemente muitas vezes senti esse cheiro na vida, mas nesse momento leva-me para um estado diferente e passa a ser qualquer coisa que não sei o que é. Aí, começo a refletir sobre o cheiro da tangerina, envolvo-me e o poema nasce. Não é uma explicação científica nem filosófica (...) O poeta é incoerente (...) pode revelar coisas que não sabia um minuto antes e muito do que o filósofo não sabe explicar. Às vezes até me pergunto se poesia é Literatura".

sábado, 2 de outubro de 2010

O que é um haiku

Ora aqui está uma pergunta que originou inumeráveis respostas. Por todo o mundo se procura estabelecer, delimitar o que é um haiku. E porquê este frenesim de saber se é ou não é? Eu acho que é para frear os novatos que, logo que escrevem um texto curto em três versos lhe chamam isso. Nós as pessoas que querem (e nem sempre conseguem...) escrever haiku sabemos que um haiku é muito mais do que três versos. Pessoalmente eu acho que também o haiku tradicional só uma das formas que o haiku pode assumir. Temos os exemplos de Kerouac (EUA) e de Leminski (Brasil) para mostrar até onde pode ir o haiku.
Esta discussão sobre as fronteiras do haiku fica para outra vez.
Hoje gostaria muito brevemente de dizer o que eu acho que o haiku deve ter (de certa forma aquilo que eu mais aprecio quando leio um destes poemas). São fundamentalmente 3 aspectos:
1. Antes de mais que evoque algo. Algo de real, concreto, talvez presente.Que se ligue a uma realidade activa no pensamento do poeta.
2. Que seja compacto, isto é, que se sinta que nada a mais está no poema. Um haiku que nada perde se lhe for removida uma palavra, não é um bom haiku.
3. Que seja narrativo. O que eu quero dizer com isto é que um haiku tem de se projectar para além de si. Temos que ver naqueles três versos uma expansão, uma projecção para uma realidade, para um pensamento maior. Há haiku que na sua modéstia contam uma história inteira. É destes que eu mais gosto.

sexta-feira, 1 de outubro de 2010

Ainda a Lua de Outono

em cima do rio
enorme, a Lua de Outono,
encolhe a noite.


above the river
the large Harvest Moon
shrinks the night.

terça-feira, 28 de setembro de 2010

Lixo

Viajei para o Brsil apanhando três aviões. Em todos eles me serviram comida que vinha embalada e numerosas embalagens descartáveis: revestimentos, copos, talheres, pratos, bebidas, sal e pimenta, iogurtes, etc, etc. Calculo que originei pelo menos um quilo de lixo só para comer nos aviões...
Porquê tanto material descartável? Muito simples: fica mais barato do que tratar material não descartável. Mais barato em pessoal, em percas de material, lavagem, armazenamento, etc. etc.
E a conclusão disto tudo? A poluição absurda que fazemos vai continuar porque é mais barata. Se comerçarmos a poluir menos vamos agravar a crise porque fica mais caro em pessoas e recursos. E a crise económica é hoje; a ambiental ainda demora...É risível, não é?

tudo de plástico.
E o corpo?
É descartável?

sexta-feira, 24 de setembro de 2010

Ontem, 23 de Setembro

Ontem juntaram-se 25 pessoas em Belém (Lisboa) para jantar e para a leitura e escrita de haiku. A Luz nasceu enorme e sanguínea por detrás de nuvens. Depois ocultou-se e choveu mesmo um pouco a comprovar que era mesmo o equinócio... Mas quando acabamos o jantar, lá estava ela, majestosa e vibrante (com a sua estrela companheira à direita).
A reunião terminou pelas 23h00 e proporcionou-nos momentos que só a amizade e a poesia podem trazer.

segunda-feira, 20 de setembro de 2010

Mais Lua...

luar no Tejo
é quase pena
que venha o Sol.


sombra de luar
enfim a vitória
da noite.



digo-te adeus -
a lua está
descolada do céu.


o luar pousa
por cima dos telhados-
uma mão sobre quem dorme.


luar de Outono
em cheio na abóbora -
parece sorrir.


só de longe
as estrelas olham
a Luz Cheia


uma ponte de luz
sobre o Tejo -
Luz de Outono.


falo-te a sussurrar -
frente a nós
a Luz de Outono.

A Lua das Colheitas

Quinta-feira, dia 23 de Setembro de 2010 podemos contemplar a primeira Lua Cheia de Outono: a "Lua das Colheitas" ou a "Lua do Caçador".
No Japão esta Lua é celebrada com encontros, com comidas especiais e com a escrita de haiku. Vamos fazer isso em Lisboa (ver post anterior "Tsukimi 1").
Mesmo que não vá, leitor, levante os olhos para a Lua no dia 23 e deixe que o luar (uma das palavras mais bonitas da língua portuguesa) lhe ilumine o rosto e empape a alma.

luar no Tejo -
mesmo sem vento
a água treme.

quinta-feira, 16 de setembro de 2010

Anúncio de jornal

Metade de mim
procura metade de ti.

segunda-feira, 6 de setembro de 2010

Mineiros chilenos

debaixo de nós
a setecentos metros
estamos nós.


que riqueza
será encontrada
por estes mineiros?



saem no Natal!
afinal só morre quem está
à superfície.



a Terra
protege-os com as mãos
em concha.



e diz a senhora:
- E onde fazem cocó?
- Que horror!



diz o mineiro-filósofo:
- Nem aqui se consegue
estar sozinho!

quarta-feira, 1 de setembro de 2010

Tsukimi 1

A Associação de Amizade Portugal-Japão vai promover no dia 23 de Setembro (quinta-feira) um Tsukimi – contemplação da primeira Lua de Outono.
Este evento inicia-se com um jantar no Hotel Altis – Belém
Variedade de Sushi & Sashimi (Peixe cru laminado) - 18 peças por pessoa
Gelado de Chá Verde
Bebidas: Vinho Br. Sauvignon e Arinto ; Vinho Tinto Tinta Roriz e Touriga Nacional; Saké; refrigerantes e águas minerais
Após o jantar (cerca das 21h30) os participantes dirigir-se-ão ao jardim do Japão (frente ao Hotel) e aí serão lidos em português alguns haiku clássicos sobre este evento.
Os participantes serão então convidados a escrever um ou vários haiku sobre a Lua de Outono. Estes poemas serão depois lidos e comentados em grupo.
O preço do jantar é 35,50 Euros e, os participantes que assim o desejarem poderão optar só pela presença no programa do Jardim do Japão.
Todos são bem –vindos e esperamos uma noite de boa gastronomia, poesia e convívio.
Junto enviamos ficha de inscrição que deverá ser enviada para a D. Maria de Lurdes em aapjgeral@yahoo.com, ou para Rua de Artilharia Um nº104 -5ºesq, poderá ainda telefonar para o nº 96 471 2096 para esclarecimentos.

Fim de Verão...

e se atrás deste
- já no fim -
não viesse outro dia?

terça-feira, 31 de agosto de 2010

2 haiku de Verão

manhã na praia
só buracos na areia -
vento da noite.

um poema -
o que sobra das palavras
depois do apara-lápis.

domingo, 29 de agosto de 2010

Inclusão

Tanto falo de "Inclusão"!!! Inclusão práqui, Inclusão práli...
Três perguntas sobre a Inclusão:

1. Estar incluído é obrigatório?
2. Se eu achar que o ambiente em que me querem incluir é de má qualidade, tenho mesmo assim que aceitar?
3. Estar incluído é só por si um critério de qualidade de vida?

E três saídas:

1. A Inclusão é quase sempre boa
2. Não é boa quando os ambientes são de fraca qualidade
3. Mais vale só que mal acompanhado...

E um haiku:

dia do professor:
hoje ninguém olha
para mim.

quarta-feira, 25 de agosto de 2010

(Im)Possível

Tornar a vida
possível
só através de crenças no impossível
ou pelo menos no improvável:
na eternidade
ou no que se suspeita que há
para lá do horizonte.

Também há
quem vive a vida dos possíveis,
do provável e do certo.
Mas talvez a vida
não saiba ao mesmo...
(ou sabe mas só acendem a esperança
debaixo do lençol).

domingo, 22 de agosto de 2010

Viajar 3

Chega de viajar!
Já olhei para a televisão sem ver,
Já fui passear a Belém
Já dancei contigo
Já reli o Pessoa e ouvi o Bach
Já comprei o totoloto
Até já atravessei de barco para Cacilhas.
Tenho de parar de viajar:
Para a semana tenho um congresso em Espanha.

quarta-feira, 18 de agosto de 2010

Viajar 2

chego de viagem -
agora sei a cor do tapete
de minha casa.

segunda-feira, 16 de agosto de 2010

Viajar

Tempo de Verão, de féris e de viagens. Muito se fala agora do "bom que é viajar" e neste campo se encontram os mais díspares valores: há quem viaje para "dizer que já lá esteve", há quem viaje para "ver", há quem viaje para não ficar parado, etc., etc.
Lembrei-me de um excerto do "Livro do Desassossego" na excelente edição de Teresa Sobral Cunha da "Relógio d'Água" (pp.511):

"Que é viajar, e para que serve viajar? Qualquer poente é o poente; não é mister ir vê-lo a Constantinopla. A sensação de libertação, que nasce das viagens? Posso tê-la saindo de Lisboa até Benfica, e tê-la mais intensamente do quem vá de Lisboa à China, porque se a libertação não está em mim, não está, para mim, em parte alguma".


Fernando Pessoa que tanto viajou sem quase sair de Lisboa sabia bem que viajar é bem mais que mudar de lugar.
(E agora com a tão maior facilidade de mudar de lugar, a ânsia de viajar criou uma "certificação da confusão". Eu estive lá, eu vi (penso que vi...) portanto... é verdade. É verdade! É verdade!! É verdade!!!)

Concurso Internacional de Haiku

A Associação de Amizade Portugal-Japão vai organizar um concurso Internacional de Haiku. O tema do concurso é o mar e a viagem comemorando os 150 anos da ssinatura do Tratado de Paz Amizade e Comércio entre Portugal e o Japão. O regulamento do concurso vai ser divulgado no princípio de Setembro e o concurso estará aberto até Dezembro. Poderão concorrer poesias haiku escritas em português e em inglês.
É o primeiro concurso deste tipo realizado em Portugal e portanto esperamos uma participação significativa de poetas portugueses.

quinta-feira, 12 de agosto de 2010

Outra forma

Reforma. Re forma. Ter outra forma. Criar outra forma de vida. Reformar a vida.
Ontem:
- estás reformado?
- Não, ainda estou reformado...
O que vem depois? Ou esta é a última forma da minha vida?



assumou a minhoca -
era alvorada
ou crepúsculo?

quarta-feira, 11 de agosto de 2010

Haiku de Chave

Aqui fica o resultado de um mini-workshop de haiku que realizei com crianças, jovens e adultos em Chave, concelho de Arouca. Como lá fui parar? Bom, um convite de dois militantes do Bem chamados Bonina e Pedro que lá criaram uma organização chamada "Semente de Futuro".
Caros Bonina e Pedro: a semente é boa, espero que o chão a receba e a alimente.
Aqui ficam os haiku:



pele do cobra
em cima da rocha -
arrepio.


uma cobra à sombra
ao lado do ribeiro -
Que sorte!


fio de água
ressuma das pedras -
tranquilidade.


uma árvore -
mil verdes
num tronco.


ouço água a cair
e de repente
já não estou cansado.


o som da água
aponta o moínho
entre o verde.


junto ao ribeiro
uma bica de água
ouço a frescura.


o moinho
tem saudades
do grão.


caminho de infância -
agora o moínho
está mais perto.


na cascata
só o musgo -
e toda a beleza.


na Natureza
o raro é belo -
o comum também!

terça-feira, 10 de agosto de 2010

Chave

Chave. Perto de Arouca. Um vale com uma igreja lá no fundo. Tudo verde salpicado de casais brabcos e laranja. Cheira a figueira e caruma. Cá estão as cigarras acompanhadas por um longínquo martelar. E um sino, de meia em meia hora a dizer: "Estou aqui e enquanto eu estiver, tu estarás também!".

o neto e o avô
sob as velas do moinho -
a vida passa.


ramo seco
e os ouriços moços -
no mesmo castanheiro.

uma cigarra
arrasta a tarde
no seu canto


a badalada
entra pela floresta
como uma faca.


uma carvalha
de vestido comprido -
despe-te! É Verão!


no campo
só inventamos
cidades imperfeitas



salada na mesa
todo o mundo
quer lá estar...

domingo, 8 de agosto de 2010

Verão

crepúsculo de Verão -
tarda
a paz da noite.

sábado, 7 de agosto de 2010

Opiniões "Do outro lado do mundo"

O livro "Do outro lado do Mundo" tem recebido comentários muito encorajadores o que mostra que a ideia do livro é correcta e tem muito potencial.
Deixo aqui duas opiniões de José Marins e Nelson Savioli, ambos poetas de haiku do Brasil:






Caro David, colegas

Estou encantado com os haicais dessas
crianças portuguesas e neozenlandesas.
Belos, líricos, objetividade e criatividade,
percepções!
Destaco estes:
-
Primavera!
Na sombra
A relva está mais fria.
-
Leonor Nunes, 6 anos

[É uma haicaísta pronta! E zen!]

Neste galho
Estão as cores todas
Do arco-íris.
-
Sara Ferreira, 6 anos

[Poesia e senso perfeito de observação.
Talvez o haicai mais belo da coletânea.]

O uivar do lobo
Empurra o vento
Para a frente.
-
Afonso Cabido, 5 anos.

[Só Basho escreve assim! Esse menino vai
longe registrando sensações poderosas como
esta.]

Parabéns ao editor David e ao Natsuishi e os
da equipe.

Grato pelo presente.

mia o meu gato ---
rosnado de arrepiar
no seu ronronar
-
josé marins






Dear David,

Acabo de receber o tocante livro com poesias de crianças de Portugal e da Nova Zelândia. Bacana que a obra tenha se originado de um encontro seu com o neozelandês na Lituânia. Como de costume com as crianças que são instadas a escrever haiku, inúmeros tercetos do livro são muito bons. Ficou bastante interessante colocar lado a lado os haiku das crianças lusitanas e neozelandesas.

Se tivesse que escolher um dos poemas do livro, ficaria com este de um aluno de nove anos:

As pessoas colecionam

Porcelana antiga -

Os cães apanham ossos.

[Jake Wielsma]

Parabéns pela iniciativa. Muito obrigado em compartilhar comigo o resultado dessa aproximação de antípodas pela poesia. Forte abraço,

Nelson

José Marins

Já por várias vezes aqui falei da fina sensibilidade e conhecimento profundo que o poeta brasileiro José Marins tem do haiku. Este poeta escreve regularmente numa lista de discussão chamada "haicai - l" e nela emite frequentemente opiniões com vista a ajudar os mais novatos a escrever haiku.
Publicou há poucos dias o texto que aqui reproduzo, depois de óviamente ter obtido o seu consentimento para tal...



1
O haicai não é um poema enumerativo, que junta fatos com coisas, cujos significados estão mais na subjetividade do autor do que na objetividade da leitura, do leitor. O haicai só vai existir de fato na leitura do leitor.
(O poeta do haicai deve ser o seu primeiro leitor.)

2
Há um sentido que só se realiza no haicai.
Poética existe em toda a linguagem humana, e, principalmente, no poema. Mas, a poética do haicai só existe nele. Quando dissemos que um poema é um terceto não é para desqualificar o poema de quem o fez, mas para dizer que ele não chega a realizar o haicai.
Leia isto:
-
Na névoa da aurora,
a última estrela
subirá pálida.
-
Cecília Meireles

Um leitor que desconhece poderia ler neste belo terceto um haicai. E por que não o é?
O haicai fala desta névoa e não de uma névoa genérica como se lê no terceto.
No haicai o poeta vê aqui/agora a estrela a subir ou subindo.
No terceto a estrela subirá, é futuro.
O haicai não traz o tom de aforismo, este terceto é quase um.
Só para dizer algumas diferenças. Entretanto, não estou dizendo que o terceto não é belo, ele é apreciável, emociona, convence como linguagem poética, como poema.
Porém, não é um haicai.

O sentido que só se realiza no haicai é uma qualidade denominada haimi.

Se o poema não tiver certas características ele não realiza o haimi, o sentido do haicai.

Ele, às vezes, surge como um Ah!, um pequeno eureka (que pode ir do mínimo estalo ao máximo de estalo para alguém), pode chegar a ser um insight para outros.

Leia este:
-
névoa da manhã
dissipando devagar ---
a última estrela
-
Independente de ser um bom haicai, de você gostar ou não, ele tem os "componentes". A visualidade que ele nos traz sustenta o haimi, um sentido diferente do terceto de Cecília.

3
Para buscarmos o haimi do nosso haicai visual, temos que observar se ele traz uma linguagem visual. Sem inventar muito, há uma visualidade que pode ser buscada.

Tome-se a cena haicaística, encontre o detalhe que se tornará o haicai, ou se ele se apresenta (aos olhos treinados!), busque a linguagem que faz sentido haicaístico.

Alguns elementos são mais visuais que outros.
Veja esta relação de termos que são apropriados à visualidade:
- cor, brilho, nitidez, luminosidade, foco, tamanho, distância, movimento, velocidade, localização, bordos, proporção, dimensão, composição, pintura, desenho, etc.
-
Aviso: Estas são considerações pessoais, relativizadas. Comentários são bem vindos.

Um abraço,
-
vento cortante -

enrolado na bandeira

passa o torcedor

-

josé marins

terça-feira, 3 de agosto de 2010

The gap...

Uma pergunta que me tem andado na cabeca: Porque e que nos que sabemos o que fazer nao o fazemos? Porque sabendo como fazer bem, fazemos mal? Como sabendo o que nos aproxima da felicidade, fazemos o que nos junta a tristeza?
Hoje alguem dizia que precisamos de maos, de cabeca e de coracao. Se calhar nao fazemos o que devemos porque algum destes tres elementos falta. Sera?
(Escrito em Belfast e portanto sem acentos...)

terça-feira, 27 de julho de 2010

A meta...

Só cheguei
verdadeiramente
onde não
quis chegar.

As metas,
que eu pensei destinos,
eram engodos.
Depois de uma
veio outra...
sem parar nunca.

Quando sinto onde estou
vejo que o destino
é o caminho
e avanço por ele
na desesperança
de encontrar um lugar.

quinta-feira, 22 de julho de 2010

Tsukimi

No dia 23 de Setembro a Associação de Amizade Portugal - Japão vai organizar um Tsukimi. Trata-se da contemplação da primeira lus de Outono, o tempo em que a Lua está mais próxima da Terra e se apresenta maior (enorme...) e amarelada (lindíssima...).
Quase todas as culturas celebram esta primeira Lua de Outono (A "Lua do Caçador") e os japoneses dedicam-lhe um afecto especial organizando festas em que a contemplação e a celebração da Lua são o tema central.
E nós vamos organizar um Tsukimi. Antes uma refeição japonesa no Restaurante Altis de Belém e depois, no jardim japonês frente ao Tejo vamos ler poesias, contemplar a Lua e fazer haiku.
Vamos lá marcar na agenda: 23 de Setembro!



Lua de Outono -
só, no banco do jardim,
um idoso sorri.

sábado, 17 de julho de 2010

Richard Zimler

Falo hoje do livro do escritor Richard Zimler "Love's voice: 72 kabbalistic Haiku". São 72 haiku impregnados de espiritualidade e de contacto com a transcendência. Refere-se a un Yavé que apesar de diferente e distante, se aproxima paradoxalmente do quotidiano nos homens. Aqui e ali os poemas mostram algum pendor de interacção e mesmo de pregação ao leitor.
A forma é muito bela e os poemas têm o fundamental do haiku: leveza e concisão.
Deixo aqui dois deles:

Smell the Lord's flowers
and take shade under his leaves,
then harvest yourself.

Only if we face
death do we get a chance to
glipse what lies beyond.


Congratulations Richard!

quinta-feira, 15 de julho de 2010

As reacções

Temos tido algumas reacções à publicação do livro. Não muitas que os portugueses não são muito de dizer que está bem quando julgam que está bem... Em Portugal devemos contar como votos a favor as abstenções e se for assim, estamos muito felizes com as manifestações sobre o "Do outro lado do Mundo".
Das que se manifestaram gostaria de realçar uma: uma mãe que mandou uma mensagem a dizer: "Hoje a história de adormecer foi o livro de haiku. Muito bonito!".

quarta-feira, 7 de julho de 2010

Uma autora e o editor...


Mesmo no dia em que saiu o livro, o editor teve o privilégio de se fazer fotografar com uma das autoras: Melissa de 5 anos.

E aqui fica o registo...

terça-feira, 6 de julho de 2010

Verão

noite de Verão -
a roupa sai do corpo
do avesso.




praia ao crepúsculo -
a areia parece
não ter grãos.

quarta-feira, 30 de junho de 2010

Já saiu!!!


Caros amigos:


Como tinha anunciado há uns dias atrás, já está publicado o livro "Do outro lado do Mundo". Este livro tem 52 haiku sendo 26 de crianças portuguesas e 26 de crianças da Nova Zelândia. É um projecto muito bonito e em que se aprende que "os braços e as vozes das crianças, ainda que pareçam pequenos e frágeis, são maiores do que a Terra quando querem abraçar e cantar juntos". (Da introdução)
Há uns poucos exemplares para distribuir pelos afectos ao blog. Manifestem-se!

E vejam a capa!

segunda-feira, 28 de junho de 2010

Ai os políticos

Desta vez, este "ai" não é decepção ou de desencanto: é de surpresa. A política e a literatura já se cruzaram muitas vezes com poetas e escritores a desempenhar funções políticas. Umas vezes se dão bem outras (talvez a maioria) não tão bem...
É menos comum que pessoas que fizeram uma carreira política se deixem levar pela literatura e sobretudo tenham a ousadia de publicar o que escrevem.
O holandês Herman Van Rumpuy, presidente da Comissão europeia, acaba de publicar um livro de haiku. UAU!!!!!!!
Deixo aqui ficar dois dos seus poemas em inglês. (Eu acho que ele sabe mesmo do ofício...)


Around six,
birds ushering in the morning
audible spring.


The cold of frost
chiselsfine shoe-
tracks in the clay.

sexta-feira, 25 de junho de 2010

Concurso Internacional de Haiku

Em primeira mão: a Associação de Amizade Portugal - Japão, vai organizar um Concurso Internacional de Haiku. Os detalhes serão informados durante Setembro mas já podem ir afiando o lápis... Os poemas serão apresentados em inglês e em português.
"FAPJ International Haiku Contest", soa bem?

sexta-feira, 18 de junho de 2010

O ano da morte de José Saramago

É inevitável falar hoje da morte do escritor José Saramago. Eu não me encontro entre os indefectíveis admiradores da sua prosa e mesmo de algumas das suas ideias. Disse-o várias vezes e até neste blog.
Mas a morte, tal como a noite, envolve a realidade numa aura de recato, de distância, de respeito, de pausa. E era assim que eu queria celebrar a morte de Saramago: lembrando com distância e véu o tanto que ele fez pela Língua Portuguesa, pela Literatura Portuguesa e o tanto que ele nos estimulou a pensar (mais do que a sonhar...).
Saramago disse um dia que Deus não tinha feito nada antes da criação do mundo, trabalhou 6 dias e depois voltou a não fazer rigorosamente mais nada. Eu, que não creio num Deus criador, não usaria esta metáfora trabalhista. Mas eu, que creio num Deus amalgamado do Bem, espero que este Deus tenha hoje feito alguma coisa: que tenha abraçado a tua alma, José, como se fosses um menino.

segunda-feira, 14 de junho de 2010

Sol e sombra

Alguém que me viu de noite
disse que sofria.
De quê, não disse
Só que sofria.
De certo da doença de viver
que é sempre mortal
mesmo que a incubação seja longa.

Alguém que me viu de dia
disse que eu vivia
e com gosto.
De quê, não disse
só que vivia com gosto.
Sem a doença de morrer
que atrapalha a vida
sobretudo se a incubação é longa.

Slam poetry

Saberão o que é: uma poesia para ser declamada, ligada ao quotidiano e que não pode durar mais do que 3 minutos... o mesmo número dos versos do haiku... Sob todas as diferenças temos este ponto em comum: procuramos menos palavras e mais densidade. A slam poetry e o haiku procuram "densificar" as palavras: dar-lhes peso sem retirar a leveza (como os grandes tintos que para além do corpo não podem perder a fruta (a alma...).

que bem embutido
está o olho da serpente!
e a minha pele descola.

terça-feira, 8 de junho de 2010

Junho

Primavera -
Ao fim da tarde, a relva
espera o céu.

terça-feira, 1 de junho de 2010

Haibun

encontrei este experiente engenheiro naval pela sua mesa de trabalho tinham passado inúmeros planos de barcos de passageiros, cargueiros, petroleiros e até um pequeno navio de guerra para patrulhar a costa era um homem já idoso com olhos mansos e com umas mãos ao mesmo tempo musculadas e delicadas o homem dos barcos disse-me ele o que mais me encanta num navio é a forma como a ele corta a água como se formam aquelas efémeras colinas de água e espuma quando a proa avança na água aí se vê a elegância do barco aí se vê se ele é hamonioso e se está bem construído e sabe ao longo destes anos aprendi muito e sobretudo uma lição um dia planeei um barco e sofistiquei o desenho do casco e da proa para ele ter um corte de água perfeito e consegui mas o barco não durou muito tempo as limitações do desenho que eu tinha feito afectaram a sua funcionalidade e mesmo a sua velocidade em breve foi desmantelado ficou tão perfeito neste detalhe que eu esqueci que a foma como a proa afasta a água é a consequência de toda a natureza do navio e não deve ser vista um fim em si mesmo hoje olho as proas e adivinho o barco nunca mais desde aí falei em proas perfeitas e deficientes


a proa abre a água
uma fonte
no mar.

domingo, 30 de maio de 2010

Tamanho

Tamanho tem a ver com poder, tem a ver com influência. Normalmente o maior tem mais poder e mais influência. Nem Fernando Pessoa /Caeiro escapou a um "mode d'emploi" sobre o tamanho: "Para ser grande sê inteiro, nada teu exagera ou exclui..."
Estamos e somos sempre inconformados com o nosso tamanho e isso é certamente uma das explicações para a nossa superação, para querermos transcender o pouco que somos.
É assim que vivemos rodeados de sonhos, de pessoas a abarrotar de sonhos de serem mais ricas, mais reconhecidas, mais influentes, mais conhecedoras, mais viajadas...
Ah, o tamanho... comparado com o que quer que seja fica SEMPRE tão pequeno...

o meu apartamento
é grande demais
para mim.

sexta-feira, 28 de maio de 2010

Pôr-do-Sol

Há pores-do-Sol
de chumbo
que não prometem nada
que simplesmente selam
um fim indeterminado e viscoso.
E a surpresa
é só de quem não sabia
que quase todos os dias
acabam em pores-do-Sol
como estes.

quinta-feira, 27 de maio de 2010

Brasil 3

há o silêncio -
mas as flores não param
de seguir a brisa.

domingo, 23 de maio de 2010

Brasil 2

Flamboyants em flor -
passeios partidos
raízes e betão.

quinta-feira, 20 de maio de 2010

Brasil

ao lado da estrada
na mesma direcção que eu -
um cão sem coleira.

quarta-feira, 19 de maio de 2010

Stresshaiku

sábado de manhã -
tomo duche depressa
como ontem.

domingo, 16 de maio de 2010

Do outro lado do Mundo

As crianças de 5 e 6 anos de uma escola de Lisboa, desenvolveram comigo e com a educadora - Patrícia Bandeira - um projecto de escrever poesia haiku. O resultado ficou muito interessante e agora temos o projecto de publicar um livrinho com estes haiku e com mais outros vindos de escolas da Nova Zelândia. Vai ser um livro com haiku dos antípodas e por isso lhe vamos chamar "Haiku do outro lado do mundo". Vamos ver se conseguimos publicar o livro ainda em Junho e, se tivermos candidatos, podemos distribuir alguns pelos nossos leitores. Aceitamos candidaturas...

o vento de Primavera
do outro lado do mundo
é de Outono.

domingo, 9 de maio de 2010

Que me espera?

Que me espera
quando regressar da guerra?
Os cantos das mesas arredondados,
O chão gasto e polido
Os assentos das cadeiras debotados...
Que me espera?
Só sei que lá estará o silêncio
Emboscado entre os sons da casa
Esperando uma aberta
Para me perguntar
Se valeram a pena
Os clarins e as feridas
As fardas e os medos.
E se eram esses
os ideais...

domingo, 2 de maio de 2010

La realité...


(Clique na imagem para a tornar maior)
depasse la ficcion". Também se diz que "a vida imita os romances" e não, como se podia pensar o contrário...

Há tempos publiquei neste blog um haiku que era assim:


um pássaro

passou pela tua cabeça -

de longe sorriste.


A ideia era criar uma leitura dupla entre uma ideia feliz que nos assoma o espírito ( e que nos faz sorrir) e uma cena real que presenciei quando vi uma pessoa ao longe e o vôo de um pássaro parecendo que atravessava a cabeça.

Há pouco ao ver as fotografias que tirei em S. Petersburgo reparei que numa delas, um pássaro tinha passado pela minha cabeça. Eu sorria e ao fundo o Grande Rio Neva e Palácio de Inverno dos Czares da Rússia...

Aqui a realidade seguiu a ficção.

sábado, 1 de maio de 2010

1 de Maio

uma borboleta
pousa na falésia -
o mar à espera.

quarta-feira, 28 de abril de 2010

Se soubesses o que eu sei...

É um hábito bem humano (português?) que depois de alguém pedir um conselho o desvaloriza com observações do tipo "só quem cá está é que sabe" ou "se soubesses o que eu sei não dizias isso"...
E é muito verdade: quem pede uma opinião deve esperar ouvir algo que vem de alguém que não está na mesma posição de quem pede o conselho. Se estivesse na mesma osição diria exactamente o que a pessoa que pediu o conselho pensa e sente. Talvez a questão seja outra: a de valorizar quem vê com olhar inabitual e estrangeiro o que nos parece tão óbvio, inexorável e inevitável. "Se eu soubesse o que tu sabes, diria exactamente o que tu dizes... mas como sei outras coisas... quem sabe o que eu sei não te pode ser útil?"

grande silêncio
parece que as flores
pararam a ouvir.

segunda-feira, 26 de abril de 2010

Em Romeno

Acabo de receber o livro do International Haiku Contest realizado no International Festival Origami Peace Tree. Este Festival realizou-se na cidade de Iasi, Roménia em 2009.
O livro publica os poemas apresentados neste Festival e tem por título "One thousand Cranes" (em Romeno "O mie de Cocori" e em Português algo parecido com "Mil grous".
Dois dos meus poemas estão publicados neste livro e vou transcrevê-los em Romeno. Alguém dá um palpite de como são em Português?


ploaia de iarnã
mã preface -n origami.
Curând primãvarã.


un copac tâiat.
Cerul rãmas in locul sãu
atât de adânc.

quarta-feira, 21 de abril de 2010

Ficou bonito...



Ficou mesmo bonito o logo das comemorações dos 150 anos da assinatura da assinatura do Tratado de Amizade entre Portugal e o Japão. No rodapé vêem-se as três datas mais significativas: a de 1543 - chegada dos portugueses ao Japão, 1860 - a assinatura do tratado e a actual.
Por cima, o Monumento das Descobertas em Belém e o grande Sol Nascente a aparecer por detrás. Quem sabe não é possível captar uma imagem fotogrática semelhante à do logo?

domingo, 18 de abril de 2010

Uma Prenda de Primavera

Ela há dias de sorte: hoje Yvette Centeno faz-me chegar um poema que ofereceu a este blog. Antes de mais ele aqui está:


Cai a tarde
passam morcegos
no espelho da cidade
fogem da escuridão
atravessam as almas.

E agora o mais me impressionou nele. De um ponto de partida calmo, crepuscular e aparentemente tranquilo, gera-se o movimento e o prenúncio da noite, ou melhor, da Noite. O movimento cria-se pelo paradoxo dos morcegos não correrem para a escuridão mas sim dela fugirem; o prenúncio é dado pelo seu vôo que não só atravessa o ar mas fere as almas. E talvez seja este atravessamento que melhor sintetiza o ambiente do poema que sob uma capa quase bucólica, fala de uma improvável fuga à escuridão e de uma inexorável vulnerabilidade da alma.
É um texto muito denso na sua aparente simplicidade mas também outra coisa não seria de esperar da pena que o escreveu.
Muito obrigado, Yvette!

sábado, 17 de abril de 2010

Auf Deutch, bitte!

Encontrei o poeta austríaco Dietmar Taucher no Festival de Poesia de Druskininkai na Lituânia. Um homem ainda jovem e com um olhar muito arguto sobre o mundo mediato e imediato.
Dietmar Taucher publica uma revista intitulada CHRYSANTHEMUM que pode ser consultada em www.chrysanthemum-haiku. net.
No número da revista que acaba de sair, estão publicados alguns dos haiku feitos pelos poetas participantes no Festival. Dois dos meus textos aqui estão publicados com a curiosidade de estarem pela primeira vez traduzidos para a Língua de Goethe.
Aqui ficam. Obrigado Dietmar!


sentado na cama
luar nos meus pés nús -
Outono em Druskininkai.

sitting on the bed
moonshine on my bare feet -
Autumn in Druskininkai

Im Bett sitzend
Mondschein auf meinen bloßen Füßen -
Herbst in Druskininkai.





o arco-iris
nas folhas do castanheiro -
Outono em Druskininkai.


the rainbow
on the chestnut tree's leaves-
Autumn in Druskininkai.


der Regenbogen
auf den Blättern der Kastanie -
Herbst in Druskininkai

sexta-feira, 16 de abril de 2010

Dmitri Yassov


Estou de regresso de mais uma viagem a São Petersburgo - a cidade de São Pedro. Uma viagem sempre povoada de magia, beleza e experiências que me ajudam a entender melhor Portugal e a minha vida.

Lá recortei de uma revista esta foto de um famoso herói da Rússia/União Soviética. Este homem - uma lenda viva - foi herói de guerra e ocupou os mais altos cargos na hierarquia do seu país. A farda que Dmitri Yassov enverga mostra isso mesmo: uma vida longa, coberta de reconhecimento do seu valor e mérito. Impressionante...
Mas não foi este facto que me impressionou: foi a sua expressão na fotografia. Algo entre o cansado, o triste e mesmo interrogativo. Uma face que podera estar a perguntar:"Tudo "isto" valeu a pena?". É uma foto profundíssima no seu significado humano. Quem este homem com a sua farda; quem é ele sem ela? E tudo parece tão teatralmente dependente dela...
Aqui, onde esperaríamos um olhar garboso, sereno e feliz, encontramos um homem talvez céptico, talvez inquieto, talvez triste. É um exemplo do que o poeta António Gideão chamou "esse animal aflito"...

Meu respeitado herói: tudo o que fizeste valeu a pena se achas que valeu a pena. E se sim, deleita-te com o tinir das medalhas. Que elas te aplanem o sono e que o seu brilho motive outras pessoas a dar o melhor de si.


sexta-feira, 9 de abril de 2010

Mode d'Emploi

Já por várias vezes aqui referi a qualidade da revista de poesia Haiku "The Heron's Nest". Acaba de ser publicado um novo número (que pode ser pedido em http://www.theheronsnest.com/journal/

Gostava de aqui publicitar umas poucas mas certeiras orientações para quem quer escrever poesia haiku da "The Heron's Nest"



Present moment magnified (immediacy of emotion)
Interpenetrating the source of inspiration (no space between observer and observed)
Simple, uncomplicated images
Common language
Finding the extraordinary in "ordinary" things
Implication through objective presentation, not explanation: appeal to intuition, not intellect
Human presence is fine if presented as an archetypical, harmonious part of nature (human nature should blend in with the rest of nature rather than dominate the forefront)
Humor is fine, if in keeping with "karumi" (lightness) - nothing overly clever, cynical, comic, or raucous
Musical sensitivity to language (effective use of rhythm and lyricism)
Feeling of a particular place within the cycle of seasons

quinta-feira, 8 de abril de 2010

Peregrino


"Peregrino" é um pequeno livro de Armando Martins Janeira (biografo de Wenceslau de Moraes e embaixador de Portugal no Japão) editado pela "Pássaro de Fogo".

É um livro de grande sensibilidade que fala do Japão e de Wenceslau (sobretudo sobre a inauguração do monumento a ele erigido em Tokushima em 1954) em que nos sentimos convidados previlegiados a presenciar as cenas descritas. Armando Martins Janeira foi certamente tocado pela mesma energia encantatória que rendeu Wenceslau.

O livro foi-me oferecido pela D. Ingrid Bloser Martins, viúva do autor e ela mesma personalidade marcante desta ponte cultural entre Portugal e o Japão. Obrigado!



terça-feira, 6 de abril de 2010

5 haiku de Páscoa

esquecido
no meu bolso um recibo
de dois lanches.



ainda crús de tudo
os cachos de uvas
em Abril.


queima como sal
a luz do sol na praia -
telemóvel: não vens?


brisa da tarde
varre por dentro as árvores
para os pardais a chegar.


enormes, a secar
as cuecas da vizinha
enfim a dar a dar.

segunda-feira, 29 de março de 2010

Gulbenkian na Primavera













A Prima Vera assoma em toda a parte. Mas mais nos jardins. No Jardim da Fundação Gulbenkian - a natureza vestida de domingo - está cheio de amostras desta Prima Vera. E até não faltou a própria rã de M. Bashô que veio aquecer-se ao terno Sol de Março.


terça-feira, 23 de março de 2010

Publicação na "Nadaline"


(Clique na imagem para a tornar maior)
Já tinha dito aqui que a revista "Nadaline" da Estónia publicou os meus 21 Haiku "GAZA". Imagino que nenhum dos meus leitores os poderá ler mas, de toda a maneira, aqui fica o testemunho. E sempre o meu agradecimento ao poeta Andres Ehin que os traduziu.


As I wrote before, "Nadaline" journal from Estonia, published my 21 Haiku "Gaza". I imagine that no one of the readers of this blog will be able to read them, but, anyway here "l'épreuve du crime". And thank you again for transelation, Andes Ehin!




segunda-feira, 22 de março de 2010

Torre

Hoje, dia 22 de Março, à entrada da Primavera, estive na escola da Torre em Lisboa. Estive lá para, juntamente com outros familiares, falar às crianças de poesia.
E o que parecia difícil tornou-se muito fácil: as perguntas das crianças foram (como se deve esperar) inteligentes, pertinentes e muito estimulantes: "Distingue a sua poesia da de outros poetas?", "Como é que se escreve poesia?", "Em que se inspira?", etc.
Para ilustrar o que é o haiku - o tipo de poesia japonesa que lhes fui falar - levei e ofereci a cada criança uma pequena concha de madrepérola apanhada nas praias do Algarve no Verão passado. A concha serviu para ilustrar que a beleza afinal está "nos nossos olhos" e que se a procurarmos ela não nos deixará partir de mãos vazias. Assim, a ideia não é procurar a "perfeição" ou a "simetria": é olhamos para a nossa concha dialogando com ela independentemente de ela parecer perfeita ou não. E nem imaginam o que as crianças viram nas suas insignificantes ( e imperfeitas) conchas: transparência, veias, lisura, arco-iris. manchas, formas evocadas, enfim... Talvez a mensagem tenha passado: a poesia é feita por pessoas imperfeitas sobre coisas imperfeitas mas pode acabar por ficar bem...
Disse-lhes: sabem porque é que o haiku tendo só 3 linhas é um texto suficiente? É porque que a outra parte da poesia tem que ser completada pelo leitor. E logo surgiram as opiniões: Ah... um haiku é um puzzle incompleto, quem o lê é que o completa...
Devia haver muitos letreiros em todos os locais públicos que tivessem escrito: "É proibida a entrada a quem não confiar em crianças!". (Jesus disse uma coisa parecida, não foi?)


sala dos 5 anos -
um feto despenteado
pelo sol da manhã.

domingo, 21 de março de 2010

21 de Março

Hoje chega ofialmente a Prima Vera. Os primeiros brotos, a vida a nascer de ramos que pareciam vencidos, secos e mortos pelo longo Inverno deste ano. E com ela vem a esperança de beleza, do morno, do fagueiro. Vem a esperança de uma vida que, num mundo onde tudo parece estar em risco é, mesmo assim, o mais constante e fiel que temos.
Com a Prima Vera vem também a Poesia, esta comprovadamente mais céptica em relação à felicidade. Mas mesmo assim agregada à renovação e a um novo sopro semelhante àquele que, no Genesis, fez Adão respirar.
Estavamos a precisar de ti, Prima Vera; sempre precisamos de ti, Poesia, em todas as estações do ano!



os melros cantam
desde as três da manhã -
calma! Já vou!

terça-feira, 16 de março de 2010

Primavera III

cheira a Primavera!
A vizinha está a usar
um novo detergente.

Trânsito

- "as voltas que o mundo dá!"
-"e as voltas que damos ao mundo..."
- É verdade... nascemos na mesma terra"
- "E até bem próximos..."
- "... e levamos estes anos todos para nos encontramos"
- "Só foi pena ter sido por um acidente de trânsito" - disse o Mercedes ao Opel.

sexta-feira, 12 de março de 2010

E ainda...

A Luzia Lima-Rodrigues fez uma outra versão do haiku postado antes. Eu acho que ficou bem melhor. Obrigado!


entre a blusa e a pele
entra a lua e a mão -
ambas cheias.

quarta-feira, 10 de março de 2010

Uma quadra

salvo-me fugindo,
salvas-te ficando:
assim iludimos
o tempo que vai passando.

terça-feira, 9 de março de 2010

Hairóticos / Hairotics

vinda de cima
entre a blusa e a pele -
a mão. Cheia.

from above
between the blouse and the skin -
a hand. Full.




há dez minutos
inclinada sobre a mesa -
ainda não leu nada.


ten minutes passed
bending on the table -
she didn't read anything yet.

domingo, 7 de março de 2010

Nadaline

Ontem, sábado, foi publicado na revista literária "Nadaline" da Estónia o conjunto de haiku "GAZA". A tradução é de Andres Ehin (já aqui colocada neste blog).
(Como será ler os meus haiku sobre Gaza debaixo da neve? Estou curioso...)


na foto do deserto
cai um floco de neve -
que vai nascer ali?

sábado, 6 de março de 2010

Prima II (take two)

inexorável como uma borbulha
o ar morno sopra ao de leve
embrulhando
perfumes ainda verdes.

toda a Primavera
está neste vento:
frésias e junquilhos
flores de amendoeira e lírios.

E tu também.
Tu, sem a qual as flores seriam irrisórias
e a Primavera
um espasmo pueril.

Prima II

É por agora que a terra se rende à Primavera.
Estava eriçada nos seus frios,
na radicalidade dos seus ventos,
o chão apertado pelas chuvas,
e o sol longo e impotente.

Mas está a acabar o cerco.

Inexoráveis e capciosas as raízes,
os brotos, as azedas,
as primeiras amendoeiras
e os primeiros ventos mornos
agitam em segredo a terra parada.

E ela rende-se alegre a este manso conquistador:
entreabre - e depois escancara - as suas portas
com uma secreta satisfação de ser conquistada.

Como imaginamos a conquista de uma Mulher.
Ou de um Homem.

sexta-feira, 5 de março de 2010

500

O que se vê quando se olha para trás? Quando olho para trás deste blog vejo que faltam 14 mensagens para chegar às 500. Um dia vou perder um tempito a ver o que tenho vindo a pensar, a sentir, a citar e a esquecer.
Uma ideia para comemorar era fazer um concurso nacional de haiku. Alguém alinha?

quinhentos
muito menos do que graõs de areia
na minha mão.

quinta-feira, 4 de março de 2010

A Prima

e lá de longe
de onde nasce o vento
a Primavera!


from far away
where wind begins:
Spring!

segunda-feira, 1 de março de 2010

Heron's Nest 2009

Já aqui mencionei várias vezes a grande qualidade e devoção ao haiku que tem a revista "The Heron's Nest" (literalmente "O ninho da garça".
A revista acaba de dar a conhecer os melhores haiku que publicou no ano de 2009 depois de uma votação entre todos os seus leitores. Aqui fica o resultado:




Grand Prize: POEM OF THE YEAR (18 votes totaling 131 points)
mile high . . .
adding my breath
to the clouds
— Jim Kacian (March Issue)


First Runner-up: (13 votes totaling 106 points)
Milky Way —
maybe tonight
I’ll conceive
— Brenda J. Gannam (December issue)


Second Runner-up: (13 votes totaling 104 points)
graveside —
my breasts
leaking
— Nora Wood (March issue)


Third Runner-up: (14 votes totaling 86 points)
honeysuckle
where you first hear
the river
— Burnell Lippy (September issue)

domingo, 28 de fevereiro de 2010

Se não acreditasse, não via.

Ai as provas... nós que andamos atolados em triliões de informações contraditórias sobre se "o Governo quis", "se o primeiro ministro mentiu", etc. etc., somos tentados a fazer um juizo final e definitivo sobre o que realmente se passou... Tentação que só aceitamos se formos ingénuos. E porquê? Porque não se julgam factos; fala-se de emoções, de interesses e de estratégias que não estão claramente postos em cima da mesa.
Esta "comissão de inquérito" vai tentar desfazer o "nó górdio" de provar pelos factos se o governo teve essas intenções: "ver (provar) para acreditar!!!".Mas o assunto não é esse: não é ver para crer.
O que se passa aqui, como em tantos âmbitos da vida pública e privada, é: "Acreditar para ver". Conforme o que acreditamos, vemos "coisas" e que até (ai de nós...) nos parecem óbvias. Quem terá legitimidade para dizer que estamos certos ou errados?
Ah este difícil contrato social...


restos de nespresso
batalhões no chão da sala -
já ouço clarins.

quarta-feira, 24 de fevereiro de 2010

Solidão

A jornalista Sara Roy acaba de publicar um artigo sobre Gaza. E termina com estas dramáticas palavras: "O povo da Gaza sabe que foi abandonado. Algumas pessoas disseram-me que só sentiam esperança quando estavam a ser bombardeadas: assim pelo menos alguém lhes daria atenção".
Até uma bomba faz companhia contra a solidão do cárcere... (Quando é que "isto" acaba?)

previsão do tempo -
enfim alguém sabe
o futuro, em Gaza.

terça-feira, 23 de fevereiro de 2010

Coluna

Vertebral. Um traço que corre de Norte a Sul: de cima a baixo (e também do direito à esquerda, do frente e do atrás). Ter coluna = ter valores, orientação. Não pensar que vale tudo, não agir como se o certo não existisse. O certo existe: pode não ser perene mas existe e aprecio as pessoas que no meio de tanto nevoeiro e ventos contrários empurram o corpo e a coluna para o estreito caminho (Basho...) que acreditam que está certo.

no vendaval
os ramos quase a partir -
mas não.

quinta-feira, 18 de fevereiro de 2010

Quaresma

o vazio puxa-me o olhar.
Sem cores nem formas,
com luz parada e mortiça,
penso na noite impensável
como se não acreditasse no mar
com ele a bater
nos meus pés nus..

domingo, 14 de fevereiro de 2010

Valentim

tomei banho
como a primeira vez fosse -
São Valentim

quarta-feira, 10 de fevereiro de 2010

Andar à pesca...

Existe uma expressão em língua inglesa que acho muito curiosa: "fishing for compliments". Diz-se que anda à pesca de cumprimentos a pessoa que faz "tudo e mais um par de botas" para receber algo que lhe assegura que fez alguma coisa de bom. Esta pesca pode penosa de se assistir: há pessoas que, em lugar de ver o cumprimento como uma consequência, o vêem como um objectivo. Como se fossem as borbulhas que provocam o sarampo e não o virus do sarampo que provoca as borbulhas...
É bom quando sabemos quantos centímetros temos de altura e quantos não temos. Andar nesta volátil pesca denota, antes de mais, que a pessoa não confia no mérito do que fez: mais depressa faz fé num elogio de circunstância do que numa análise mais objectiva.
Andar à pesca de cumprimentos... com cana ou rede é sempre um bocadinho deprimente de ver... (e vê-se muito...)

primeiras flores:
a Primavera chega devagar
mas inevitável.

terça-feira, 9 de fevereiro de 2010

Passado

Passado. Passado é aquela parte do tempo que nós (ou alguém) já percorreu com os seus passos. Passado, caminhado, percorrido. Mas também há passos para dar: nem todos os passos são passos/passados. Hoje brindo aos passos que passam (avançam) para o amanhã.

o que andei passou
dou passos para o que vem aí -
como o caranguejo?

quarta-feira, 3 de fevereiro de 2010

Fevereiro


(Clique na foto para a tornar maior)
Neste Fevereiro frio, já espreita a Primavera: as "azedas" - as vibrantes flores dos trevos - enchem os campos de um amarelo vibrante. Hoje mesmo vi ao lado da estrada duas árvores ainda nuas de folhas mas já cobertas de flores brancas. É isso!!! Toca a chamar a Primavera!

Aí vai uma foto (do abençoado quintal da Ivany) para ajudar as árvores a lembrar o que é ter as folhas a fazer cócegas nos ramos...Huuuuummmmm...



terça-feira, 2 de fevereiro de 2010

a gate left open


Alice Frampton has been coordinator of Haiku' Canada's pacifi-kana region and Asssociate Editor of "The Heron's Nest".

She wrote a delicate and rich book named "a gate left open". It'a a book marked by an acute observation of Nature and a refined humor. It's a book where education is present together with a humanistic view of that complex process of bending the knees to teach someting to someone.

Thank you, Alice!



Alice Frampton tem sido a coordenadora da região do Pacífico da Sociedade Haiku Canadá e Editora Associada da revista "The Heron's Nest".

Escreveu um livro rico e delicado chamado "a gate left open". É um livro marcado por uma observação pertinente da Natureza e um humor refinado. É um livro onde a Educação está presente e acompanhada por uma visão humanista daquele processo que nos leva a dobrar os joelhos para ensinar algo a alguém.

Obrigado, Alice!


segunda-feira, 1 de fevereiro de 2010

Movimento

O movimento está em todo o lugar, As coisas que convencionamos chamar "paradas" e "inertes" estão em movimento. O problema é que a nossa efemeridade não nos permite ver este movimento. Duramos tão pouco que só muito dificilmente conseguimos ver que a vida é um filme e não uma fotografia. Ver movimento nas coisas (pessoas, montanhas, plantas, ...) paradas... Ora aqui está um bom ponto de observação para pensar em haiku...

corre luz no telhado -
reflexos dos carros ao sol
penteiam as telhas.


.

domingo, 24 de janeiro de 2010

Andres Ehin


Andres Ehin is an excellent poet from Estonia. He has a large number of publications in a lot of languages. Recently he published the haiku book "A Chafer Kisses the Moon" in Japan.
I met Andres Ehin in Lithuania. He is a man with a sophisticated sensibility and with a very cordial interaction.
He translated into Estonian my booklet "GAZA". I don't resist to publish here the work of Anfres Ehin (maybe only for visual purposes...).
Thank you very much. Andes!
Andres Ehin é um excelente poeta da Estónia. Tem uma vasta obra publicada em múltiplas línguas - entre as quais galego ("Vello ceo Nórdico")- e uma galeria repleta de prémios significativos. Escreve haiku e publicou no Japão há pouco tempo um livro lindíssimo chamado "A Chafer Kisses the Moon"
Encontrei na Lituânia Andres Ehin. Foi um encontro de uma grande cordialidade e de entendimento fácil. Deparei-me com uma pessoa com uma requintada e profunda sensibilidade.
Andes Ehin traduziu para estoniano a série dos meus 21 haiku "GAZA". Eles vão ser publicados na Estónia. Não resisto a deixar aqui (certamente só para prazer visual dos leitores) os meus textos em estoniano. Muito obrigado Andres!


Gaza haikud
1
seinast lööb läbi
terasest liblikatiib
Gaza liblikad
2
kes kallutas maa
rannatu mere rüppe
ulguvas Gazas
3
mürsk otsapidi
oliivitüves kinni
pildike Gazast
4
Jumala käsi
pigista kivi seest vett
januses Gazas
5
ainult raketid
on väleda taibuga
juhmunud Gazas
6
kirudes saatust
põgusalt antakse suud
lahku viib Gaza
7
armsate silmi
veereb põrandaprakku
armutus Gazas
8
palmipuud on täis
sõjasaastaseid datleid
Gaza puiesteil
9
oliivide tuhk
põletab päevalilli
Gaza peenardel
10
seintel on kirjad
Jumal mispärast oled
hüljanud Gaza
11
luurib ja puurib
kõrgustest täiskuukiiker
kaitsetut Gazat
12
Jumal mis plaani
sa meiega pead hinge-
vaakuvas Gazas
13
uhiuus saabas
vedeleb tolmusel teel
hüljatud Gazas
14
ära sa iial
pilku taevasse heida
kui oled Gazas
15
lapsed tahaksid
pigem pimedad olla
silmitus Gazas
16
varblasi magab
paljaks põlenud oksal
Gaza keskpargis
17
hoiata vaikus
meid järgmise ohu eest
petlikus Gazas
18
tihke müüri ees
pole soovideks ruumi
tänases Gazas
19
naine ei teagi
kelle matustel nutab
leinavas Gazas
20
viigipuu õide
ei lähegi tänavu
kõrbenud Gazas
21
prognoose teha
julgeb ilmaennustus
isegi Gazas

sexta-feira, 22 de janeiro de 2010

Haiti , ai de ti (II)

Não se pode prever o futuro ainda que seja ele que ilumina a nossa vida. Dizem as pessoas "prudentes": `´E preciso aprender com o passado!". Para mim, nada mais bizarro! Aprender com o passado? O que ilumina o nosso presente é a nossa visão do futuro. O que é o presente para quem não consegue olhar para um ponto imaginado? Lá. Onde acaba o horizonte.
(Quando assentar o pó, para onde vai olhar o povo do Haiti?)

Haiti, ai de ti...

Quem, discernindo, pode antever o futuro?
Agora foi o Haiti... Massacrados pela história, pelos governos curruptos, pela sua situação estratégica, pelo menospreso dos poderosos, faltava ainda esta catástrofe aos haitianos. Catástrofe natural? Não: social. Um abanão de terra, numa sociedade há muito desiquilibrada pela ganância e pelo desamor.

Agora
as ruinas do Haiti
vêm-se melhor.

segunda-feira, 18 de janeiro de 2010

Experi(ci)ência

A experiência pode ser uma ciência, um conhecimento se... (o importante é o "se") refletirmos sobre ela e em consequência disso mudarmos ideias, representações e comportamentos.
Se assim for então talvez possamos dizer que em lugar de "experiência" temos "expericiência".


que gatos ariscos!
Quando lhes ameaço bater
fogem!

sexta-feira, 15 de janeiro de 2010

Sono

depois da insónia
sono da madrugada -
sol no corpo nu.

quarta-feira, 13 de janeiro de 2010

Ansiedade

ansiedade -
ao ver que chegava à praia,
afogou-se.

domingo, 10 de janeiro de 2010

Seagull

only a photo
remained of the slow flight
of the seagull

só ficou uma foto
do vôo lento
da gaivota.

sexta-feira, 8 de janeiro de 2010

Outra versão

cai a folha
o pardal olha imóvel -
convite à valsa?

quarta-feira, 6 de janeiro de 2010

D'aprés Kerouac

o pardal olha
a folha de Outono -
convite à valsa?

terça-feira, 5 de janeiro de 2010

Explicações...

O que é isto do mundo às avessas? A frase pode ter mil interpretações todas válidas e pertinentes mas eu gostava de juntar uma derivada do fracasso da Conferência de Copenhaga. Passo a expôr: estamos permanentemente mergulhados em apelos bem humorados, inteligentes e criativos ao consumo massivo. Mal saídos do Natal já começam os saldos...
No meio deste consumo desenfreado aparecem "coisas" como: "salve o planeta comprando (mais) isto".
Alguém tem dúvida que o que se compra com o rótulo de ecológico é uma trapaça até porque não precisávamos desta coisa? E que o resto (o que não é ecológico) é uma trapaça ecológica também? Era isto que eu queria dizer com o mundo às avessas: estamos interessados em que o aço do canhão seja reciclado. O que o canhão faz, isso já é outra coisa.
Às avessas, pois claro!

na noite fria
o ar parece mais puro -
refinaria.

domingo, 3 de janeiro de 2010

Ver o mundo às avessas a ver se o vemos direito!


MMX

Novo século, nova década, novo ano. Tudo novo. Tudo? Claro que não. Novo só o ânimo, o sonho, olhar para para além para ver o que não existe agora e que talvez não exista nunca. Cada vez que este ínfimo grão de poeira a que andamos agarrados dá uma volta ao luzeiro que lhe dá vida, nós mudamos a contagem do "tal" tempo. E convida-nos a (re) animar, a (re) começar, a (re) tomar e sobretudo a (re) sonhar (não confundir com "ressonar").
Ninguém é feliz sozinho, portanto (e até por isso) desejo a quem ler estas linhas um novo ano na esperança de mais, de mais longe e de melhor.