domingo, 29 de janeiro de 2012

Sete anos - Homenagem a Jacob

Sete anos de suspiros
a andar sobre alfinetes
sete, ao todo sete,
a encostar devagar o portão
e a mandar calar o galo de madrugada.

engrossou na boca a saliva
e os lábios quase colaram
o olhar foi para o lado
e a coluna para baixo
sete anos... bem medidos.

clareia agora o nevoeiro
e o disco vê-se ao longe:
dentro do peito palpita
o coraçao e a liberdade
a liberdade de saber e de não saber!
Acabaram os sete anos!

quarta-feira, 25 de janeiro de 2012

Um novo tempo

Tem sido muito discutido se a nossa estrutura biológica e sobretudo neuropsicológica é compatível com a avalanche de informação, interesses, tarefas, ocupações, compromissose pressas que atiramos para cima de nós. Eu acho que lá ser compatível é... mas deixa-nos num estado absolutamente lastimoso...



gosto de todos!
O meu amor
mede-se pela rapidez.

segunda-feira, 23 de janeiro de 2012

Dragão

Aí vem o dragão!
Deitando fogo pelas fuças
aí vem o dragão!
De escamas reluzentes,
de olhos esgazeados,
aí vem o dragão!
ora corre ora voa
ora aquece, ora queima
ora defende, ora ataca.
aí vem o dragão!

levantamos os olhos para ele
esperamos que ele fale
e da boca enorme e chamuscada
saim palavras possíveis
compreensíveis e justas.

aí vem o dragão!

tem tudo o que não temos:
distância, tamanho, fogo
poder, couraça, força e astúcia.

Será que nos entorna a sopa
e tapa os caminhos de casa?

aí vem o dragão!

Inverno

estremece um galho -
acorda o pardal
na manhã de Inverno.

Empédocles

Tenho lido com assombro a "Antologia da Poesia Grega Clássica" - Portugália Editora. São revelações repetidas ao ler o que homens e mulheres tão distantes de nós no tempo pensaram e exprimiram com tanta beleza e profundidade. Hoje cito uma estrofe de Empédocles de Agrigento que, no sec. V antes de Cristo, escrevia assim:

Porque é impossível que alguma coisa possa
nascer do que não existe e nunca
se viu nem ouviu dizer que o que existe
deve desaparecer. O que existe
existirá sempre, onde quer que se apoie.

quinta-feira, 19 de janeiro de 2012

Oportunidades

Encorajamos as nossas crianças a tentar. Tentar mesmo errando. Seguindo aquela máxima de "errar, errar muito, errar cada vez melhor". No fundo, transmitimos a ideia que não é importante errar o importante é tentar (e tentar cada vez melhor). Mas o certo é que esta perspectiva só funciona em alguns domínios. Poder-se-à dizer isso a um cirurgião? A um engenheiro que constrói uma barragem?
Mas hoje queria refletir sobre o erro em Educação. Acredito que é importante que a criança tenha espaço para errar (e refletir sobre o erro) em Educação. Mas a Educação enquanto processo é igual a uma cirurgia: só se tem uma oportunidade. Nunca mais aquelas crianças voltarão a ser crianças; nunca mais a Educação poderá dizer: - "Desculpa lá, enganei-me!".Contemplar o erro é uma estratégia pedagógica não é um desígnio da Educação.

pedra no ar:
- Pára!
Tarde demais.

segunda-feira, 16 de janeiro de 2012

Gulbenkián

Sempre gostei de biografias. Conhecer as pessoas por detrás da sua obra, por detrás que aquilo que eles quiseram que ficasse público da sua acção. Na verdade, sempre me apaixonou o dilema "o homem é maior que a obra" ou "a obra é maior que o homem".
Vem isto a propósito da exposição "Memória do Sítio" que está Gulbenkián e que mostra a casa da Avenue Iéna e alguns detalhes da vida do celebrado colecionador. Uma das partes que mais me interessou foi a entrevista em video em que o neto de Gulbenkián falava do quotidiano da casa. Enfim, ouvimos algumas bizarrias sobre a extraordinára meticulosidade do seu avô e ainda medidas estranhas que salvaguardavam a valiosa coleção. Por exemplo: só cinco amigos da filha de Gulbenkián podiam - depois de cuidadosamente examinados - entrar em casa; os outros encontravam-se com a filha nos bancos da rua onde o mordomo lhes ia levar as bebidas...
Quantas perguntas... Mas só uma: que valor para ele tinham as pessoas comparadas com as peças da sua coleção? Será que alguém alguma vez olhou nos olhos do experiente arménio e lhe disse: "Gostava que me tratasse com uma das sua peças mais queridas: mas sou só uma pessoa".

uma flor
um desenho de uma flor:
qual levo?

domingo, 15 de janeiro de 2012

Se... mente

a bolota no chão
sabia de cor o carvalho:
apodreceu na pedra.

segunda-feira, 9 de janeiro de 2012

Certo!

está escrito na areia
e também na água
que as tradições não acabm
e que o homem
há-de mudar.
Escorre pelo peito uma gora
turva e fumegante
ela, experiente em tudo,
apesar de nunca ter visto o sol.

terça-feira, 3 de janeiro de 2012

Ainda o mesmo tema...

Dizem que sou engenheiro
mas eu tinha dúvidas.
Pendurei na parede o meu diploma:
agora sim, sou engenheiro...

Será que o eu sou
é o que os outros acham que eu sou?
E o que valho
é o que os outros acham que eu valho?

São eles que estão certos?
Mas eles nem estão de acordo...
uns acham que sim
outros têm a certeza que não...

E eu? Que acho?
Afinal sou engenheiro,
sinto-me engenheiro
ou não?

segunda-feira, 2 de janeiro de 2012

Eduardo Lourenço

Já escrevi aqui neste blog uma reflexão sobre a justiça na avaliação dos méritos próprios. Na altura defendi que somos nós próprios os melhores avaliadores do que fazemos porque, em síntese, só nós conhecemos realmente e por dentro os motivos, as limitações, o conhecimento e as intenções como que cada um dos nossos actos é produzido.
Lendo há dias a interessantíssima entrevista que o JL publicou com Educardo Lourenço (28 de Dezembro de 2010) lá encontrei:"Não há ninguém para nos ler: nós somos leitores do nosso próprio mistério" Não poderia estar mais de acordo: nós somos lidos e leitores e isso dá-nos uma dupla dimensão que casa o humano com o natural: o que existe e o que é representado; enfim, o "meu eu" e o "meu outro".


antes de olhar para o céu
nunca tinha visto este azul -
pelo menos desde ontem.