segunda-feira, 11 de junho de 2012

Mestre José Marins: mais um texto.

A gente lê algumas vezes que o haicai proporciona ou é fruto


de um momento de iluminação, ou, numa linguagem ocidental,

um insight.



Eu tinha receio de dizer que nunca atingira esse estado de

iluminação na minha atividade de poeta do haicai. Até que

numa entrevista o haicaísta Ban´ya Natsuishi afirmou o

seguinte:



"Parece-me que no Ocidente enfatizam demasiado o satori e os



outros elementos budistas. Compor haicai é uma coisa, a iluminação é outra.

Bem separadas. Por mim escrevi mais de três mil haicais e, infelizmente,

nunca alcancei o satori. Penso, no entanto, que na escrita de um haicai pode

haver, escondido, algo semelhante ao estado de satori, mas de um modo menos

perceptível do que se julga entre vós. (...)"



Embora Natsuishi, com quem troco vez ou outra correspondência,

não seja um haicaísta preocupado com a tradição do gênero, pratica

o que chama de haicai contemporâneo, admite algum "estado de satori"

na prática do haicai.



Talvez ninguém mais pratique haicai como um "dô", um caminho.

Posso, mais uma vez, estar enganado.



O que percebo, todavia, é a existência de uma Educação Pelo Haicai.



Compreendo assim, haver alguns elementos da meditação na prática haicaística.

Por exemplo a contemplação da natureza, a educação dos sentidos para

observá-la,

o conhecimento de alguns aspectos das estações, a aceitação da impermanência.



Para mim, também, é uma meditação a sequência da realização do haicai:

vivência, haimi, escrita do haicai. (E incluo ainda as vivências

passadas, esse direito que cada poeta tem às suas memórias.)



A prática do haicai é uma meditação.



Um abraço,



ah, manhã de inverno

enquanto busco a quietude

agita-se o gato

-

josé marins



Seis haiku de Capacabana



olhos e antenas
apontados a invisíveis
diferentes.

depois de um beijo
o casal de andorinhas
cai três andares!

na cobertura
o pombo garante à pomba:
- Será aqui!

diz na Harley
que rebenta cem vezes por minuto:
- Deus é Paz!

A mãe para a filha:
-Não diga "nóis foi"
quando fala com o cachorro!

a borboleta amarela
sobrevoa a água turquesa:
Copacabana!

sábado, 26 de maio de 2012

O tamanho da vida

Todas as vidas são grandes - não em duração mas em dimensão. Se avaliassemos o tamanho que as vidas ocupam chegariamos certamente a valores muito parecidos. Assim: a ocupação de um casal de reformados, so aparentemente ´´e menos preenchida do a que um jovem casal com 3 filhos pequenos. As vidas são sempre preenchidas, sofridas, sonhadas, dececionadas, comprometidas, cheias e com ansia de se preencher. E quem não tem vidas assim, repretas com ocupações proprias... ´´e facil... preenche a sua vida a viver a vida dos outros. E assim se engana o vazio e se viaja borla no shuttle da vida.

quinta-feira, 17 de maio de 2012

Brasil

Vivo na margem de um grande rio. Na outra margem está o Brasil, igual e diferente, mais diferente que igual. no espelho a cara não parece minha - e só pode ser...

terça-feira, 15 de maio de 2012

Poetas de Marte

Cristiano Amorim, poeta e haijin brasileiro é autor de um blog interessantíssimo chamado "Os Poetas de Marte". Cristiano Amorim entrou em contato comigo pedindo para eu participar numa entrevista que ele queria fazer sobre o meu trabalho. E a primeira parte já está publicada, com muita qualidade e sobretudo com uma audiência fantástica. Obrigado Cristiano!!! Quem quiser ver a primeira parte da entrevista pode ir a: http://poetasdemarte.blogspot.com.br/2012/05/haicais-de-alem-mar.html

Rede

vejo da rede um avião aos solavancos - e penso na vida. que silêncio canta no chilrear dos pássaros!

sábado, 12 de maio de 2012

Tomislav Maretic

As unespected as good news, I received the contact of Tomislav Maretic from Croatia. He was for a short time in Lisbon and he left me a present: the translation of one of my haiku into Croatian. Thank you my fellow haijin: we will keep in touch! na nebu rode lete sporo - vrapci u zurbi

sexta-feira, 11 de maio de 2012

Bernardo Sassetti

fica de ti a música leve densa e estendida fica de ti o tempo exato entre os acordes e a inevitabilidade daquela nota que como um gota de água na ponta da folha espera cair no lago fica de ti a elegância e as arestas arredondadas sem ti a música fica incompleta e nós também.

quarta-feira, 9 de maio de 2012

Tás à espera de quê?

Estou sempre à espera: à espera da chegada e da partida que venhas e que não venhas. Espero que chegue e que não chegue, que seja tarde e seja cedo. Espero que esteja longe e seja perto, que seja hoje e amanhã. Estou à espera que seja tudo e não seja nada, que seja óbvio e seja complexo. Tudo espero e nada me parece estranho tudo me parece estranho.

terça-feira, 1 de maio de 2012

Feriado

dia feriado frente ao computador toda a família em casa. parece maior o espaço estre as coisas - dia feriado. hoje há mais pássaros? e mais nuvens? dia feriado.

segunda-feira, 30 de abril de 2012

Pensei plagiar-me

Pensei plagiar-me: as ideias estão ralas e forma pesada como um cobertor molhado. !Aquela ideia nem estava má.. E se eu voltasse a ela..." há sempre algo de novo nos passeios pulidos pelos passos. Pensei em plagiar-me mas só pensei... logo a seguir deu-me uma pena imensa das coisas que nunca falei. E fiquei com pena não porque o meu falar as enriqueça mas porque ignorá-las é uma pequena morte numa pequena vida.

quinta-feira, 26 de abril de 2012

Não há metáfora mais usada para falar da vida do que falar de uma viagem. E quem faz connosco esta viagem? É raríssimo que seja(m) a(s) mesma(s) pessoa(s). Há pessoas que caminham mais ou menos tempo connosco. Depois o seu destino diverge do nosso, o seu passo é mais rápido ou mais lento do que aquele com queremos fazer o caminho. E assim encontramos pessoas que só ao de leve partilham a nossa jornada e outras - normalmente a família e "aqueles" amigos - com quem nós caminhamos muito tempo juntos. às vezes temos até a ideia que caminhamos sozinhos e outras vezes queríamos caminhar sozinhos mas não é possível... É assim que o caminho se faz... ombro a ombro mais ou menos tempo com muita gente com quem sentimos que os nossos passos podem caminhar nem que seja uns poucos metros juntos.

segunda-feira, 23 de abril de 2012

É uma sabedoria não se deixar consumir pelo passado nem pela ambição ou o medo do futuro. Estar no presente como se só ele existisse, sabendo que este momento presente é irrepetível e único. "Não vivas a vida como se fosse um rascunho - podes não ter tempo de o passar a limpo!" canta o pardal sem saber o que vai comer amanhã.

quarta-feira, 18 de abril de 2012

Olá Instituto de Odivelas

Caras alunas no IO:

Foi um grande parazer ter estado convosco no workshop de haiku. Gostei da vossa atenção, das vossas perguntas, da vossa simpatia e sobretudo dos vossos haiku.
Como prometido aqui ficam alguns deles. E não se esqueçam de caminhar sempre perto da arte e da poesia - espero que tenham gostado desta manhã tanto quanto eu.
E aí vão os haiku (com alguns toquezinhos meus...):



uma bola de pêlo
preta e cinzenta -
e a felicidade foi com ela.


todas as palavras
são pequenas,
mas significam tudo.


árvore avó
a seiva de sangue negro
renasce em mim.


as gaivotas voam
planam como folhas
sobre a terra.


falas do tempo
mas as folhas caem
e tu nem sabes.


não existo:
só a natureza
é o meu conforto.


ao vento,
rompendo a tijoleira -
uma flor amarela!


das madeiras ocas
e das cordas vibrantes
sai o gesto de quem toca.


meio-dia
o sino da torre toca -
é hora de voar...


frente dos sinos:
abanam ramos
no mesmo lugar.


apertei a caneta,
assobiei para o alto...
a tinta não sai.


pelo céu cinzento
sopra o vento -
caem as folhas.


pequenas folhas
caem no silêncio -
a noite chegou.


sorriso bonito
no rosto calmo -
coração quente.


o canto da ave
rasga o crepúsculo
do pensamento.


duas árvores unidas:
vidas partilhadas
em tudo.


Vazio -
caminhos desconhecidos
e escuridão.


correm as folhas.
É o vento que as empurra:
ele precisa delas.


um som mecânico
invade o silêncio.
E a meditação?



Claro que queria agradecer também à Dra Carmo Dias e ao Director do IE o convite e a fidalguia da receção.

segunda-feira, 16 de abril de 2012

Fotos

Hoje comemoro o "anti betismo". Anti - betismo é um movimento mal afamado, caluniado e que basicamente rejeita os comportamentos que se mostramm para parecermos que somos mais do que aquilo que somos. Hoje comemoro as pessoas que convidam os outros para casa e não pedem desculpas, os que publicitam fotos tiradas na cozinha, os que usam ténis usados e roupa "de velho": larga e confortável, comemoro as pesoas que dizem o que queriam mesmo dizer mesmo que pareça ignorante, parolo ou vulgar. É que, como dizia o nosso Fernandinho, nem só as cartas de amor são ridículas: são ridículas também as pessoas que se maquilham com hábitos, roupas e cenários que não são os habituais mas sim aqueles que elas selecionaram para parecer - sem ser - melhores do que são.
Hoje comemoro a simplicidade e a verdade.


a comida era má.
à saída tu disseste:
- "Que bom era o vinho!".

terça-feira, 10 de abril de 2012

Instituto de Odivelas

No ano passado fiz um workshop sobre poesia haiku para as alunas do Instituto de Odivelas a convite da Profa Carmo Dias. Correu muito bem e postei neste blog não só as fotos mas também alguns excelentes haiku feitos pelas criativas participantes.
Este ano vamos começar tudo de novo (o que não é o mesmo que repetir...)
Dia 18 de Abril lá estarei e comprometo-me a compartilhar aqui os resultados desta viagem pela poesia, sempre inesperada mas com garantia que ninguém dará por mal empregue o tempo que nela gastar.

segunda-feira, 9 de abril de 2012

O de hoje...

um falcão no céu -
não tiramos os olhos dele.
eu e um coelho.

domingo, 8 de abril de 2012

4 Haiku de Páscoa

ecoa no vale
só um canto de cotovia.
O dia chega ao fim.


as núvens
dormiram entre os pinheiros.
De manhã: - Adeus!



cobre o bosque
um longo canto de rola.
só um.



vôam lentamente
as aves que voam alto -
os pardais têm pressa.

sexta-feira, 30 de março de 2012

Oração

Álvaro de Campos não anda longe e Ruy Belo também não...


Vem Humanidade!
Sabemos que andas longe e andas perto
que estás perto mas sufocada e vives longe como num sonho.
E por isso temos que falar tanto de ti
de responsabilidade e de justiça.

Vem Humanidade!
Tu que ao mesmo tempo és todos nós
e o melhor de nós!
Vem-nos recordar que o poder da compaixão,
da solidariedade e do amor.

Aproxima-te de nós
e lembra-nos que somos melhores
que as iniquidades que criamos.
Diz-nos que os crimes que cometemos são involuntários
e irrepetíveis.


Surge-nos confiante.
Mostra que tens poder contra o Mal.
Mostra-te invencível para que te sigamos
e deixa que os bocados que temos de ti
se juntem aos bocados que de ti que têm os outros.


E tem pena de nós,
que só por um desvario pudemos planear
uma vida longe de ti,
e. até, que tu eras - como os afetos -
descartável e fraca.


E fica connosco
para que nos sintamos vulneráveis
à Primavera, às crianças, ao rir,
à compaixão e ao amor.
E que te respiremos doze vezes por minuto.


E não te vás embora, Humanidade!
trata-nos como crianças boas mas imprudentes
que caminham no fio da lâmina sem terem visto o cor do sangue.
E perdoa as nossas ofensas
como nós não temos perdoado a quem nos tem ofendido.

Chuva

está a chover
que saudaes eu tinha
daquelo som
ao mesmo tempo longuínquo e próximo
da água a correr nas sargetas
e da daquele rumor
fresco e constante.
está a chover:
finalmente sabemos
que nem a chuva é de graça.
Obrigado!

quarta-feira, 28 de março de 2012

Millôr da Vinci

A nossa cultura especializou-se, espartilhou-se, pulverizou-se, "balcanizou-se" tanto que tivemos que inventar um termo para definir os grandes criadores que navegam entre várias artes e várias ciências. Chamamos-lhes "Homens da Renascença".
Millôr Fernandes morreu. Era um "Homem da Renascença" e tinha a suprema classe de fazer reluzir tudo em que tocava. Não de ouro mas de graça, leveza, crítica, beleza.
Em homenagem ao grande Millôr aqui fica um dos seus haicais:

O hai-kai,
Descobri noutro dia,
É o orvalho da poesia.


Obrigado!

Sakura

vida inteira num ano!
um velho olha devagar -
cerejeira em flôr!


lifetime in a year!
an old man slowly looks -
cherry in bloom!




quem vai ver
esta cerejeira florida
na próxima Primavera?


who will see
this blossoming cherry tree
next Spring?

Senryu

em toda a parte
tudo se modifica:
é uma mundança.

domingo, 25 de março de 2012

Castanheiros

Enquanto os castanheiros
planeiam os seus ouriços
eu espero,
lisas e brilhantes,
as castanhas.
Eu e eles em silêncio
em segredo e com esperança.

sexta-feira, 23 de março de 2012

Postes e ervas

dos postes erguidos
só olho a terra que os sustenta -
a eles e às ervas.

quarta-feira, 21 de março de 2012

21 de Março!

Que dia este: já não chegava entrar a primavera e ainda por cima é o aniversário do nascimento de J.S. Bach. E ainda por cima ainda, o dia mundial da poesia. Que dia!

o neto ao avô:
- Queres que te dê um relógio?
- Não. Quero horas!

segunda-feira, 19 de março de 2012

Junto ao mar

frente ao mar
e quase do tamanho dele
se abrir os braços.

sexta-feira, 16 de março de 2012

Raínha Santa

A santa que herdei da minha avó
olha-me lá de cima
da prateleira da sala.

Para ela,
a quem a idade já toldou a vista,
só o que está mais alto é visível.

Vê a minha cabeça enorme
com uma tiara de sapatos
que pulsa alternadamente quando caminho.

Ela vê, de certo, o que está certo:
uma cabeça feita balão mal sustentada
na terra. (É isso, Raínha Santa?)

terça-feira, 13 de março de 2012

A Porta

moro em frente à porta
onde se entra e se sai
sem saber o que está do outro lado.

uns encontraram pessoas
outros o mar: só romântico
quando bordejado de terra.

sair sem saber para onde
chegar sem saber onde...
uma fina lâmina de aço no coração.

e eu aqui...
frente à porta de onde só se vê o desconhecido
a procurar sentidos.

sexta-feira, 9 de março de 2012

Ela está aí...

manhã de Primavera -
só vôos e chilreios
sob o sol quieto.

terça-feira, 28 de fevereiro de 2012

Submissão

a missão não é alta:
é baixa.
É uma submissão

com a submissão
desperdiçam-se duas vidas:
a do submissor e a do submetido.

é esta a vã glória da submissor:
- Não havemos de viver
enquanto eu quiser!

sub metidos nesta teia
a espera do click - só um click -
que solte a dança.

segunda-feira, 27 de fevereiro de 2012

Água

Eu sei que o blog é sobre poesia. Mas...e a falta dramática de água que se verifica em Portugal à estrada de Março?
Entre o momento que ligo a água quente para tomar duche e o momento em que a água está suficientemente quente, caem 8 litros de água. Quer dizer 56 litros por semana, 392 por mês, 4.704 litros por ano. Isto só para um duche.
Ontem comprei um balde que recolhe esta água que ia "cano baixo" sem utilidade. Usu-a na sanita em lugar da água do autoclismo.
Ah, o balde custou 2 euros.

só há crepúsculo
para quem fica aqui.
Ou ali.

Basho forever!

"Furu ike ya
Kawazu tobi komu
Mizu no oto"

World Haiku 2012

Acaba de ser publicado o livro "World Haiku 2012".
Mais informações em:

http://www.cyberwit.net/publications/370

quinta-feira, 23 de fevereiro de 2012

Sísifo

enorme e negro
o combóio
como sempre parece ter estado,
imóvel.

quem se interessa,
quem precisa,
quem é tão louco,
que pense que o pode mover?

e, no entanto,
fazem fila os que o querem empurrar
e, uns sós, outros em grupo,
tentam essa desiludida missão.

e de longe a longe,
muito de longe a longe,
as enormes rodas de aço
estremeçem nos carris enferrujados.

tanta é a enrgia para o mover
que nunca se pergunta
o que ou quem leva o combóio
para onde é o seu destino.

o que é preciso ´é empurrar
não que o combóio se mova.
e se mover...
- Quem é que construiu a linha?

segunda-feira, 20 de fevereiro de 2012

Dois workshops

Este é um post informativo ( e convidativo, of course...)

No dia 29 de Fevereiro vou fazer um workshop de poesia Haiku para alunas do 12º ano no Instituto de Odivelas. Já o ano passado lá estive e com muito gosto e bons resultados.
Este workshop é restrito mas, para as pessoas que gostassem de fazer uma oficina deste tipo deixo outra sugestão:


MUSEU do ORIENTE


O próximo workshop, HAIKU - UM GÉNERO POÉTICO JAPONÊS, terá lugar nos dias 20 e 27 Abril de Abril (sexta-feira) das 15.00 às 17.00
Formadora: Leonilda Alfarrobinha
Público-alvo: Adultos
Preço: € 15,00/duas sessões
Participantes: Mín.10

Uma das mais belas manifestações da cultura japonesa é a poesia, nomeadamente o género poético designado haiku ou haikai. O seu poder e encanto residem, em grande parte, na habilidade do poeta em transmitir a essência de algo num pequeno número de versos. O haiku é delicado e poderoso, preciso e fluido, concreto e vago. Apesar da concisão, abre-se um leque de sugestões e as palavras criam uma subtil ressonância em quem as lê. O haiku é um reflexo do mundo e da vida. Resulta de uma atenção emocional aos acontecimentos do quotidiano e, principalmente, aos fenómenos da Natureza. Este género poético é praticado, actualmente, por milhões de pessoas no Japão e por muitas outras em vários países do mundo.
Ficha de inscrição em : http://www.museudooriente.pt/1417/haiku---um-genero-poetico-japones--.htm

domingo, 19 de fevereiro de 2012

Gaivota

De cima abaixo
a sombra de uma gaivota
risca o prédio.

ou

tardinha de inverno -
a sombra de uma gaivota
risca um prédio.

Sabe(o)res

ao sol de inverno
só o amanhã é escuro -
hoje o ar é leve.


este inverno -
uma primavera sem flores
nem borboletas.


só uma pétala -
assim mesmo, a camélia
com toda a nobreza.


à desfilada
um cão pela praia deserta
e o dono: Já! Aqui!


lá longe
correm ondas sobre a água:
o mar acaricia-se.

sexta-feira, 17 de fevereiro de 2012

O ninho da garça . sempre

The heron's Nest e os melhores haiku deste ano!:





FAVORITE POEMS


Grand Prize: POEM OF THE YEAR (13 nominations, totaling 89 points)

a deceased friend
taps me on the shoulder -
plum blossoms falling
- Chen-ou Liu (June Issue)


First Runner-up: (12 nominations, totaling 84 points)

migrating geese -
the things we thought we needed
darken the garage
- Chad Lee Robinson (March issue)


Second Runner-up: (10 nominations, totaling 83 points)

how to dress her
for eternity -
blossom rain
- Carolyn Hall (March issue)


Third Runner-up: (11 nominations, totaling 67 points)

shanty town -
the jagged edges
of moonlight
- Sanjukta Asopa (September issue)

Construir e optar

Quando falamos de desenvolvimento da pessoas, queremos também dizer que os filhos alargam os horizontes dos pais. Os ambientes opressivos e de mediocridade enfatuada paracem morrer com os "velhos" e ser vencidos pelos "novos". Parecem...
"Oh tradição! Quantos crimes se cometeram em teu nome!?"
E mesmo aqueles que sofreram as arbitrariedades, sentem - mesmo sendo elas absurdas - que passar por elas é um tirocínio essencial. E assim se alimentam valores e práticas vergonhosas.

a mim?
Não admito!
Um pobre homem.

domingo, 12 de fevereiro de 2012

Tempo

Subiram para a cara
as rugas
das impressões digitais,

O tempo que estava adiante
saltou por cima
e ficou lá atrás,

a gordura do bife
migrou do prato
para o abdomen.

Oxalá que o mundo
as ideias e os sonhos
ainda estejam lá, à frente.
.

quinta-feira, 9 de fevereiro de 2012

Fevereiro 2012

Setenta e quatro
quinze e meio por cento
menos treze e meio
quase metade
passou do dobro
dezassete vírgula três
foram quase mil milhões
dez cêntimos a mais
setecentos e vinte euros a menos
trinta e cinco cêntimos por quilómetro
e vinte e três do IVA
dá vinte e dois euros a cada um
vinte e dois por cento da população


os números falam por si
eu falo por mim.
quando vão eles falar por mim?
e deixar-nos fora de si?

terça-feira, 7 de fevereiro de 2012

Brownies

nos teus olhos
boiam prazeres longuínquos
que só ao teu corpo sabem.

na fresta das pálpebras
escancaram-se segredos
que eu só adivinho.

inquietas, as pupilas,
iludem na sua paz
elas, que já viram todas as guerras.

quinta-feira, 2 de fevereiro de 2012

Doença de Futuro

A doença do futuro
queima a boca com café quente
e dá escaras no assento
de tanto esperar pela gente.

A doença do futuro
dá pressa de chegar "lá"
mas o lá vai sempre andando,
o lá nunca chega cá.


A doença do futuro
dá cegueira do presente
vê por defeito o passado:
só vê o que está à frente.

A doença do futuro
é de natureza mortal:
passado de vez o passado
só o presente é real.

R a moralidade:

Quem quizer fugir ao fim
não corra para o futuro
finque os pés no presente
inteiro, puro e duro.

domingo, 29 de janeiro de 2012

Sete anos - Homenagem a Jacob

Sete anos de suspiros
a andar sobre alfinetes
sete, ao todo sete,
a encostar devagar o portão
e a mandar calar o galo de madrugada.

engrossou na boca a saliva
e os lábios quase colaram
o olhar foi para o lado
e a coluna para baixo
sete anos... bem medidos.

clareia agora o nevoeiro
e o disco vê-se ao longe:
dentro do peito palpita
o coraçao e a liberdade
a liberdade de saber e de não saber!
Acabaram os sete anos!

quarta-feira, 25 de janeiro de 2012

Um novo tempo

Tem sido muito discutido se a nossa estrutura biológica e sobretudo neuropsicológica é compatível com a avalanche de informação, interesses, tarefas, ocupações, compromissose pressas que atiramos para cima de nós. Eu acho que lá ser compatível é... mas deixa-nos num estado absolutamente lastimoso...



gosto de todos!
O meu amor
mede-se pela rapidez.

segunda-feira, 23 de janeiro de 2012

Dragão

Aí vem o dragão!
Deitando fogo pelas fuças
aí vem o dragão!
De escamas reluzentes,
de olhos esgazeados,
aí vem o dragão!
ora corre ora voa
ora aquece, ora queima
ora defende, ora ataca.
aí vem o dragão!

levantamos os olhos para ele
esperamos que ele fale
e da boca enorme e chamuscada
saim palavras possíveis
compreensíveis e justas.

aí vem o dragão!

tem tudo o que não temos:
distância, tamanho, fogo
poder, couraça, força e astúcia.

Será que nos entorna a sopa
e tapa os caminhos de casa?

aí vem o dragão!

Inverno

estremece um galho -
acorda o pardal
na manhã de Inverno.

Empédocles

Tenho lido com assombro a "Antologia da Poesia Grega Clássica" - Portugália Editora. São revelações repetidas ao ler o que homens e mulheres tão distantes de nós no tempo pensaram e exprimiram com tanta beleza e profundidade. Hoje cito uma estrofe de Empédocles de Agrigento que, no sec. V antes de Cristo, escrevia assim:

Porque é impossível que alguma coisa possa
nascer do que não existe e nunca
se viu nem ouviu dizer que o que existe
deve desaparecer. O que existe
existirá sempre, onde quer que se apoie.

quinta-feira, 19 de janeiro de 2012

Oportunidades

Encorajamos as nossas crianças a tentar. Tentar mesmo errando. Seguindo aquela máxima de "errar, errar muito, errar cada vez melhor". No fundo, transmitimos a ideia que não é importante errar o importante é tentar (e tentar cada vez melhor). Mas o certo é que esta perspectiva só funciona em alguns domínios. Poder-se-à dizer isso a um cirurgião? A um engenheiro que constrói uma barragem?
Mas hoje queria refletir sobre o erro em Educação. Acredito que é importante que a criança tenha espaço para errar (e refletir sobre o erro) em Educação. Mas a Educação enquanto processo é igual a uma cirurgia: só se tem uma oportunidade. Nunca mais aquelas crianças voltarão a ser crianças; nunca mais a Educação poderá dizer: - "Desculpa lá, enganei-me!".Contemplar o erro é uma estratégia pedagógica não é um desígnio da Educação.

pedra no ar:
- Pára!
Tarde demais.

segunda-feira, 16 de janeiro de 2012

Gulbenkián

Sempre gostei de biografias. Conhecer as pessoas por detrás da sua obra, por detrás que aquilo que eles quiseram que ficasse público da sua acção. Na verdade, sempre me apaixonou o dilema "o homem é maior que a obra" ou "a obra é maior que o homem".
Vem isto a propósito da exposição "Memória do Sítio" que está Gulbenkián e que mostra a casa da Avenue Iéna e alguns detalhes da vida do celebrado colecionador. Uma das partes que mais me interessou foi a entrevista em video em que o neto de Gulbenkián falava do quotidiano da casa. Enfim, ouvimos algumas bizarrias sobre a extraordinára meticulosidade do seu avô e ainda medidas estranhas que salvaguardavam a valiosa coleção. Por exemplo: só cinco amigos da filha de Gulbenkián podiam - depois de cuidadosamente examinados - entrar em casa; os outros encontravam-se com a filha nos bancos da rua onde o mordomo lhes ia levar as bebidas...
Quantas perguntas... Mas só uma: que valor para ele tinham as pessoas comparadas com as peças da sua coleção? Será que alguém alguma vez olhou nos olhos do experiente arménio e lhe disse: "Gostava que me tratasse com uma das sua peças mais queridas: mas sou só uma pessoa".

uma flor
um desenho de uma flor:
qual levo?

domingo, 15 de janeiro de 2012

Se... mente

a bolota no chão
sabia de cor o carvalho:
apodreceu na pedra.

segunda-feira, 9 de janeiro de 2012

Certo!

está escrito na areia
e também na água
que as tradições não acabm
e que o homem
há-de mudar.
Escorre pelo peito uma gora
turva e fumegante
ela, experiente em tudo,
apesar de nunca ter visto o sol.

terça-feira, 3 de janeiro de 2012

Ainda o mesmo tema...

Dizem que sou engenheiro
mas eu tinha dúvidas.
Pendurei na parede o meu diploma:
agora sim, sou engenheiro...

Será que o eu sou
é o que os outros acham que eu sou?
E o que valho
é o que os outros acham que eu valho?

São eles que estão certos?
Mas eles nem estão de acordo...
uns acham que sim
outros têm a certeza que não...

E eu? Que acho?
Afinal sou engenheiro,
sinto-me engenheiro
ou não?

segunda-feira, 2 de janeiro de 2012

Eduardo Lourenço

Já escrevi aqui neste blog uma reflexão sobre a justiça na avaliação dos méritos próprios. Na altura defendi que somos nós próprios os melhores avaliadores do que fazemos porque, em síntese, só nós conhecemos realmente e por dentro os motivos, as limitações, o conhecimento e as intenções como que cada um dos nossos actos é produzido.
Lendo há dias a interessantíssima entrevista que o JL publicou com Educardo Lourenço (28 de Dezembro de 2010) lá encontrei:"Não há ninguém para nos ler: nós somos leitores do nosso próprio mistério" Não poderia estar mais de acordo: nós somos lidos e leitores e isso dá-nos uma dupla dimensão que casa o humano com o natural: o que existe e o que é representado; enfim, o "meu eu" e o "meu outro".


antes de olhar para o céu
nunca tinha visto este azul -
pelo menos desde ontem.